Carlos Cardoso 7 anos atrás
Em Cosmos Carl Sagan usa vários mitos antigos para ilustrar a caminhada da Ciência, mostrar como partimos do desconhecimento, de como povoamos o Universo com deuses, histórias e explicações para o desconhecido, e aos poucos fomos, subindo no ombro de gigantes enxergando mais e mais distante.
As antigas lendas são apenas metáforas imperfeitas, apenas isso. Nossa imaginação justificou os trovões como batalhas entre deuses, nossa reprodução biparental moldou nossos deuses, a mitologia indiana com seus bilhões de anos é fruto da admirável matemática deles, não o contrário.
Nenhuma dessas histórias, claro, resiste à realidade. Michelangelo pintou mais bonito, mas o mito cristão não é mais verdadeiro do que Pangu, o deus chifrudo cabeludo chinês nascido do Ovo Cósmico, criador do mundo. Não faz mais sentido que Mbombo, o gigante branco que segundo o povo Kuba, da África Central um dia passou mal e vomitou o Sol, as estrelas, a Lua e os homens.
Essas histórias são importantes, são cultura, mas não são Ciência.
Exceto para o Ministério da Educação, que em uma atitude medieval resolveu que nosso currículo é “europeu” demais, e estão mudando o currículo para ao invés de Iluminismo, Renascença, Newton, Pascal, ensinar história da África Negra e povos da América Pré-Colombiana. Você sabe, um monte de povos irrelevantes que não têm qualquer importância no Grande Esquema Das Coisas.
Se isso ficasse restrito a História e Geografia, tudo bem, mas é pior. Segundo esta matéria da Folha a Base Nacional Comum Curricular vai muito além, afetando Ciências Exatas.
No capítulo sobre “Terra, Universo e Vida” o MEC sugere ensinar a Teoria do Big Bang, mas não isolada, e sim em conjunto com a “Cosmologia indígena brasileira” e a “cosmologia dos povos pré-colombianos”.
Vejamos: de um lado temos um modelo cosmológico robusto, cada vez mais comprovado por experimentação e observação (método científico, algo que as pedagogas discípulas de Paulo Freire que infestam o MEC desconhecem) e do outro lado temos… cosmologia indígena.
Que cosmologia tem um povo que vivia na idade da pedra, não desenvolveu escrita, metalurgia e só em alguns casos tinha conseguido dominar a complexa tecnologia da cerâmica? “Ah, é bonitinho”?
“Ah mas é importante conhecer os mitos indígenas”
Não, não é. No máximo é pitoresco, se sobrar tempo, ótimo, mas não sobra. Ou se sobra é tempo onde os alunos poderiam estar aprendendo como Eratóstenes mediu a Terra usando sombras varetas e cérebro. Acima de tudo os mitos não podem ser apresentados como mais do que o que são: mitos.
Pior ainda: do mesmo jeito que fanáticos religiosos no Texas forçam o ensino de Evolução junto com “teorias alternativas” para difundir criacionismo, estão sugerindo a “cosmologia indígena” como algo colocado de igual para igual com a Cosmologia Moderna.
Eu sei que soa antipático, mas não há NADA a aprender sobre ciência com índios, desculpe. Eu sei que é bonitinho eclipses serem uma onça que come a Lua, mas isso fica melhor em uma aula de literatura, não de Física.
Você não constrói um programa espacial com Tupã e Anhanguera ou Viracoxa. Países como a Nigéria e Índia, com programas espaciais promissores e vencedores sabem ser pragmáticos e se baseiam menos em Orgulho Ancestral e mais em Newton, Kepler e Tsiolkovsky.
Essa é a grande diferença de mentalidade. Nós vivemos no passado, na ilusão de que somos injustiçados mas nossos feitos eram incríveis. A Índia se orgulha de seu passado mas investe no futuro. Hoje eles podem bater no peito e dizer ao Presidente dos EUA “Marte? É legal, já chegamos lá”. Só que eles conseguiram isso ensinando Ciência de verdade em suas escolas, não o Rig Veda.
Claro, é outra mentalidade. Qual foi o último desfile por aqui onde você viu um carro alegórico com um observatório celebrando a ciência brasileira?