Meio Bit » Games » Jogos AAA e o fim da criatividade

Jogos AAA e o fim da criatividade

Shawn Layden diz que os estúdios de médio porte estão desaparecendo e que se dependermos apenas dos jogos AAA, a criatividade estará condenada

18/10/2024 às 6:32

Desde que deixou o comando da divisão Sony Interactive Entertainment Worldwide Studios, Shawn Layden se especializou em fazer previsões sombrias sobre a indústria de games. Para ele, a chegada de “empresas não-nativas” despontava como algo prejudicial, mas o que realmente parece incomodar o executivo é como a criatividade poderá sofrer devido o foco nas grandes produções, também conhecidas como jogos AAA.

Crédito: Reprodução/Freepik

Dessa vez o discurso de Layden aconteceu na Gamescom Asia, quando ele chamou a atenção para o desaparecimento dos estúdios de médio porte. Ao refletir sobre como os jogos estão sendo produzidos atualmente, o sujeito afirmou:

“[No passado] gastávamos muito mais tempo olhando para os jogos e não perguntando ‘qual é seu esquema de monetização’, ou ‘qual é o seu plano de receita recorrente’, ou ‘qual a sua fórmula de assinatura’? Fazíamos a pergunta simples: é divertido? Estamos nos divertindo? Se você dissesse sim para essas perguntas, normalmente receberia um sinal verde. Você não se preocupava tanto com a peça final, para melhor ou para pior.”

Contudo, Shawn Layden reconheceu como a indústria mudou, com os projetos AAA atualmente custando na casa dos três dígitos em milhões de dólares e que por isso, a tolerância de risco anteriormente era muito mais alta.

“E você está olhando para continuações, está olhando para imitadores, porque os caras das finanças traçaram a linha e dizem, ‘bom, se o Fortnite fez tanto dinheiro nesse período, minha imitação de Fortnite pode fazer isso nesse período’,” lamentou. “Estamos vendo o colapso da criatividade nos jogos atualmente, com a consolidação de estúdios e o alto custo de produção.”

Crédito: Divulgação/Epic Games

E para ele, algo que ajuda a puxar a indústria cada vez mais para baixo é justamente a força que os estúdios medianos perderam. Layden citou como exemplos a Interplay, Gremlin, Ocean e THQ. Logo, “se você [puder se tornar] AAA, você sobrevive ou se faz algo interessante no espaço indie, também pode [sobreviver],” disse.

Mas se o executivo pode ter exagerado um pouco em sua colocação sobre apenas os indie e os jogos AAA terem alguma chance de faturar, poucas pessoas discordarão da sua reclamação em relação às sequências e cópias do que faz sucesso.

Eu ainda adicionaria a essa lista as remasterizações. Com isso não quero dizer que me desagrada ver o retorno da primeira trilogia da série Tomb Raider, dos primeiros Soul Reaver ou Suikoden. É ótimo que as novas gerações possam ter contato com esses clássicos ou mesmo nós, que os experimentamos quando foram lançados, possamos revisitá-los de uma maneira mais próxima do que nossa memória acredita ser como pareciam.

Contudo, como não estranhar a tentativa de vender novamente um jogo como Horizon Zero Dawn ou um The Last of Us? Mesmo sabendo que esses relançamentos só existem porque há demanda e que eles trazem melhorias, fica evidente o esforço para tentar sugar o máximo possível os grandes sucessos e ao fazerem isso, as empresas estão, sim, maltratando a criatividade.

Um remaster, já?! (Crédito: Divulgação/Guerrilla Games)

Embora Shawn Layden admita que essa falta de criatividade não seja exclusividade dos videogames, com o mesmo problema afetando os filmes, ele afirma que ao contrário do que vemos nos jogos, na sétima arte há espaço para produções com orçamentos medianos. Além das próprias salas de cinema, que recebem esses longas, ainda temos plataformas de streaming, com algumas delas aptas a exibirem filmes assim.

Por isso, uma maneira para que a criatividade não morra e defendida não só pelo ex-Sony, mas por muita gente, é darmos mais oportunidade aos indies. “Se pudéssemos ter um pouco mais de interesse, empolgação e exposição para esse tipo de jogos de menor orçamento, mas supercriativos e superincomuns,” especulou. “Gostaria de ver mais disso, porque se vamos depender apenas dos arrasa-quarteirões, acredito ser uma sentença de morte.”

Contudo, não estou convencido de que os projetos de médio porte estão condenados. A minha impressão é justamente o contrário disso, com o lançamento de títulos que se colocam entre os indies e os AAA estão ganhando cada vez mais relevância.

Senua's Saga: Hellblade II (Crédito: Divulgação/Ninja Theory)

Se olharmos só para o que foi lançado em 2024, acredito que jogos como Prince of Persia: The Lost Crown, No Rest for the Wicked, Senua's Saga: Hellblade II, Warhammer 40,000 Space Marine 2 e Astro Bot se encaixariam nesta categoria. Se eles deram o retorno que seus criadores (e financiadores) desejavam, aí é outra história, mas penso que a categoria está bem servida.

Mas acima de tudo, sigo convicto de que há espaço para todos. Seja o projeto algo de pequeno porte, médio ou um AAA, o importante é que o jogo seja bom e por mais competitivo que possa ser esse mercado — e ele é —, de tempos em tempo acabamos vendo o surgimento de uma nova febre e quando isso acontece, inevitavelmente voltamos a um dos pontos criticados por Layden, que são os copiadores.

Enquanto isso, o debate sobre o custo de produção dos jogos, o valor pedido por eles ao consumidor e o tempo de duração das campanhas continua. Mas independentemente de qual lado você se colocar nessa discussão, o fato é que a produção de quase todos os jogos terá um objetivo principal: gerar lucro para os seus criadores. Se isso conseguir casar com a entrega de um produto de qualidade, aí todos sairão ganhando.

Fonte: GamesIndustry

Leia mais sobre: , , , .

relacionados


Comentários