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Street Fighter, o filme: 30 anos, e ainda fazendo dinheiro

Embora pouco, a bomba cinematográfica Street Fighter: A Última Batalha ainda gera receita à Capcom, de forma constante desde 1994

25/06/2024 às 11:56

Ninguém nega que Street Fighter: A Última Batalha, o filme de 1994 estrelado por Jean-Claude Van Damme e Raul Julia, baseado na franquia de luta da Capcom, é uma bomba. Ao mesmo tempo, todo mundo reconhece que ele é parte importante do processo que permitiu aos games serem adaptados com mais frequência a outras mídias, com o ainda pior Super Mario Bros. (1993), o também ruim Double Dragon (1994), e o mais razoável Mortal Kombat (1995).

Street Fighter: A Última Batalha é uma fonte de receita constante, embora pequena, à Capcom (Crédito: Divulgação/Edward R. Pressman Productions/Capcom/Universal Pictures/Columbia Pictures/Sony)

Street Fighter: A Última Batalha é uma fonte de receita constante, embora pequena, à Capcom (Crédito: Divulgação/Edward R. Pressman Productions/Capcom/Universal Pictures/Columbia Pictures/Sony)

O que ninguém esperava, é que mesmo sendo um filme sofrível e uma adaptação sem sentido algum, Street Fighter: A Última Batalha continuasse sendo uma fonte de receita estável à desenvolvedora japonesa; embora pouco, ele rende alguns milhares de dólares aos cofres da Capcom, todos os anos, há 3 décadas.

Street Fighter e a cauda longa

Street Fighter foi a terceira franquia de games a se tornar um live action com áudio original em inglês, chegando aos cinemas um mês depois de Double Dragon. Em termos gerais, mesmo a aventura de Mario e Luigi, estrelada por Bob Hoskins e Dennis Hopper, não foi a pioneira, no que a "honra" coube ao quase desconhecido filme japonês Mirai Ninja (1988), baseado em um game para Arcade da Namco de mesmo nome.

A Nintendo, por sua vez, lançou em 1986 a primeira adaptação fora de games de todas, o longa animado Super Mario Bros.: The Great Mission to Rescue Princess Peach!, recentemente restaurado em 4K a partir da película original, mas divago.

Voltando aos brigões de rua, o filme de 1994 foi muito mal de bilheteria, no que ele custou US$ 35 milhões e rendeu apenas US$ 33,4 milhões em casa (US$ 99,4 milhões de renda global oficial), ou seja, fechou no vermelho.

A renda fora dos Estados Unidos se explica por parte do público não ser composto por fãs dos games, pois Street Fighter: A Última Batalha entrou para a história como o último filme de Raul Julia; o ator porto-riquenho faleceu dois meses antes da estreia, no que ele já estava bem mal durante as gravações do filme, rodadas na Austrália no mesmo ano.

Verdade seja dita, mesmo como um filme de artes marciais, Street Fighter: A Última Batalha é bem fraco, ainda que conte com experts da área no elenco como Van Damme no papel de Guile, ou a então semi-desconhecida Ming-na como Chun-li, posteriormente a primeira Mulan, nossa agente da S.H.I.E.L.D. e caçadora de recompensas favorita. Já a cantora Kylie Minogue, que encarnou a Cammy, era um fenômeno na Austrália, mas levemente conhecida no resto do mundo, principalmente devido ao single I Should Be So Lucky, de 1988.

O que ninguém explica é o filme continuar rendendo alguns trocados à Capcom, ano após ano, desde então, mas este é exatamente o caso.

De acordo com uma postagem no X, em nome de um indivíduo que compareceu à última reunião de acionistas da desenvolvedora, foi comentado que o filme continua a gerar receita de forma estável, na casa de "dezenas de milhões de ienes por ano", o que definitivamente não é muito, dada que a moeda japonesa não possui centavos. Convertendo para a moeda norte-americana, estamos falando de algumas centenas de milhares de dólares anuais, provavelmente através de royalties e licenciamentos.

Por exemplo, Street Fighter: A Última Batalha está disponível para compra e aluguel digitais no Brasil apenas no Amazon Prime Video, que também suporta streaming mediante assinatura acessória do Sony One, que chegou em maio de 2024 ao país; fora de nossas paragens, o filme podse ser assistido no Hulu, no que ambos serviços revertem trocados adicionais à Capcom.

Claro que o filme com Van Damme não rende nem perto do que o estúdio lucra com seus games, que vêm anotando recordes de receita ano após ano, mas quem vai recusar dinheiro livre e sem perrengues?

A clássica cena final do filme, com os atores reproduzindo as poses de vitória dos lutadores nos games (Crédito: Reprodução/Edward R. Pressman Productions/Capcom/Universal Pictures/Columbia Pictures/Sony)

A clássica cena final do filme, com os atores reproduzindo as poses de vitória dos lutadores nos games (Crédito: Reprodução/Edward R. Pressman Productions/Capcom/Universal Pictures/Columbia Pictures/Sony)

Um filme memorável, pelos motivos "certos"

A produção de Street Fighter: A Última Batalha foi caótica, como era de se esperar. A Capcom, como co-financiadora do projeto, injetou a maioria dos US$ 35 milhões do orçamento (US$ 74,17 milhões em 25/06/2024, corrigidos pela inflação), mas exigiu que o filme fosse lançado em dezembro de 1994, para aproveitar um ano com dois lançamentos nos cinemas.

Meses antes, em agosto, o longa animado Street Fighter II: The Animated Movie, muito mais fiel aos games, chegaria às salas de projeção dos principais mercados; no Brasil, ele só desembarcou em fevereiro de 1996.

Voltando ao live action, boa parte do dinheiro foi garfado por Van Damme (US$ 8 milhões), que a Capcom queria no papel de Guile, e Raul Julia, que aceitou encarnar o vilão M. Bison por seus filhos serem fãs dos jogos, e o processo lhe permitia passar mais tempo com sua família. A redução da grana disponível forçou os produtores a escalarem uma pletora de desconhecidos para os demais world warriors.

Por sua vez, a entrada de Kylie Minogue no elenco foi uma "recomendação" do Sindicato de Atores da Austrália, para a escalação de um ator/atriz local, no que a vaga de Cammy era a única restante em aberto; já o ator japonês Kenya Sawada, que interpretou o capitão Sawada (quão original...), foi um contratado direto da Capcom e a forma de descaracterizar o lutador Fei Long, talvez para não irritar os representantes do espólio de Bruce Lee. Note que na foto acima, Sawada faz a mesma pose de vitória do praticante de jeet kune do.

Devido à condição física de Julia, severamente enfraquecido devido sua longa batalha contra um câncer no estômago, a produção teve diversos problemas para treinar os atores, no que o diretor Steven E. de Souza (Comando Para Matar, Duro de Matar 1 e 2, Máquina Mortífera, O Sobrevivente, etc.) não podia pegar pesado; todos tinham uma janela de poucas horas antes das filmagens, o que não dava para garantir sequências de ação realmente críveis.

Mesmo debilitado, Raul Julia entregou uma interpretação final excepcional, com ele mastigando o cenário (que, por sua vez, era absolutamente mastigável), entregando um M. Bison ainda mais megalomaníaco que sua contraparte dos videogames, um traficante de drogas que ascendeu à posição de ditador da nação fictícia de Shadaloo, que não possuía nenhum tipo de superpoder; suas habilidades eletromagnéticas e capacidade de voar eram providas pelo traje.

Algumas de suas falas são memes eternos, como o clássico "game over", após supostamente afundar Guile com minas submarinas (usando um controle de Arcade em sua plataforma voadora), a cena dos dólares Bison, sua citação à Bíblia enquanto tenta fritar Guile, e um dos discursos mais egocêntricos da história do cinema.

Além de humilhar Chun-li com uma única frase:

Street Fighter: A Última Batalha ainda deu a volta completa, gerando um novo game com atores digitalizados, Street Fighter: The Movie, desenvolvido pela Incredible Technologies e lançado para Arcade em junho de 1995. Desnecessário dizer que ele era um terror, e enfureceu a direção da Capcom a tal ponto, que estes resolveram ajustá-lo e criar uma versão separada, mas similar para consoles domésticos (e foi distribuída pela Acclaim, a mesma de Mortal Kombat), com o resultado sendo ainda pior.

A produção desse game foi um caos por si só, com atores desacostumados com o processo de captura de movimentos, tendo que fazer cada pose, postura e golpe para ser fotografado e digitalizado, enquanto outros, como Van Damme, fecharam tudo em menos de uma hora de sessão, sem direito a uma segunda tomada.

Ainda que o resultado fique devendo muito aos demais games da série Street Fighter, e não se iguale sequer à qualidade que Ed Boon e John Tobias alcançaram com a franquia Mortal Kombat na época (MK3 saiu dois meses antes, em abril de 1995), ambas versões, para Arcade e Sega Saturn/PSOne tentam ao menos serem fiéis ao material original, implementando os golpes clássicos que os atores não usaram nos filmes.

Ainda assim, notas para os poderes elétricos de M. Bison, no game interpretado por Darko Tuscán, dublê de Raul Julia, e a técnica da Cammy em que ela prendia o oponente com sua trança, de forma similar ao golpe mais famoso e uma das marcas registradas da franquia Mortal Kombat.

Kylie Minogue, no traje clássico da Cammy, durante sessão de captura de movimentos para o game Street Fighter: The Movie (Crédito: Reprodução/Incredible Technologies/Capcom)

Kylie Minogue, no traje clássico da Cammy, durante sessão de captura de movimentos para o game Street Fighter: The Movie (Crédito: Reprodução/Incredible Technologies/Capcom)

Ninguém em sã consciência tecerá elogios por Street Fighter: A Última Batalha, muitos menos por ambas versões do game Street Fighter: The Movie, mas o filme foi importante para mostrar, ainda que de forma mambembe e caótica, que havia sim interesse, por parte do público, em ver seus heróis do videogame na tela grande. A única coisa que queríamos, e que demoraram a entregar, foram produções de qualidade.

Mortal Kombat, o filme de 1995 dirigido por Paul W. S. Anderson (Monster Hunter e franquia de filmes Resident Evil, todos estrelados por sua esposa, a atriz Milla Jovovich), era uma produção centrada em artes marciais muito melhor construída, em roteiro e cenas de ação, mas no geral, levaram muitos anos até as produções alcançarem níveis aceitáveis quando postos lado a lado com os materiais originais. Basta lembrar que tivemos a era Uwe Boll.

Ainda assim, a aventura para lá de descaracterizada de Guile, Cammy, Chun-li, os "trambiqueiros" Ryu e Ken (o que foi estendido para o desenho animado ocidental), e muitos outros, é parte relevante (e que ainda rende grana) da história dos videogames pulando para outros formatos e adaptações, por pior que seja.

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