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Alguma coisa está transmitindo sinais de rádio do centro da galáxia

Observações do centro da Via Láctea revelam sinal de rádio com alta taxa de polarização, que aparece e desaparece sem nenhum tipo de padrão

2 anos e meio atrás

Um estranho sinal de rádio, vindo do centro da galáxia, está se provando uma verdadeira dor de cabeça: observações feitas desde 2019, quando o objeto foi identificado pela primeira vez, mostram que ele não segue nenhum padrão astronômico conhecido. Seu brilho apresenta variância em períodos irregulares, como se ele fosse "ligado" e "desligado" aleatoriamente. Ele também apresenta uma polarização considerada alta, ou seja, sua luz oscila em apenas uma direção, mas ela também varia.

Desconsiderando soluções oriundas de ficção científica, astrônomos acreditam que o sinal errático pode ser originado de uma classe de objeto estelar completamente nova.

Parte do conjunto de 36 antenas do radiotelescópio ASKAP, que detectou a transmissão misteriosa (Crédito: Divulgação/MRO/CSIRO)

Parte do conjunto de 36 antenas do radiotelescópio ASKAP, que detectou a transmissão misteriosa (Crédito: Divulgação/MRO/CSIRO)

O objeto recebeu o longo e complicado nome de ASKAP J173608.2-321635, que responde por ter sido identificado pela 1ª vez pelo Australian Square Kilometre Array Pathfinder (ASKAP), um radiotelescópio composto por 36 antenas, situado na (claro) Austrália. A combinação de letras e números são as coordenadas do objeto no espaço observado.

O objeto que é centro do artigo, conduzido pelo Dr. Ziteng Wang da Universidade de Sydney, possui uma série de características estranhas. Primeiro, ele não emite nenhum outro tipo de sinal dentro do espectro eletromagnético, além de ondas de rádio. Raios X? Infravermelho? Nada.

Isso faz com que ASKAP J173608.2-321635 seja um objeto de difícil visualização, e os dados que o ASKAP retornaram eram bem curiosos. Uma análise preliminar demonstrou que ele não possui padrões para suas emissões, que podem durar semanas, desaparecer por um tempo, depois voltar e durar menos tempo, e ficar por uma janela bem maior "desligado", quase como se houvesse alguém mexendo na chave geral, em períodos aleatórios.

Em um primeiro momento, os cientistas não acreditam que o sinal seja proveniente de uma rajada rápida de rádio (FRB), um pulso de rádio que dura muito pouco tempo, por este ser acompanhado geralmente por um sinal de raios X, e em alguns casos, também de raios gama.

Imagem do centro da galáxia fornecida pelo ASKAP; no detalhe, dados do MeerKAT mostram o sinal aparecendo e sumindo (Crédito: The American Astronomical Society) / rádio

Imagem do centro da galáxia fornecida pelo ASKAP; no detalhe, dados do MeerKAT mostram o sinal aparecendo e sumindo (Crédito: The American Astronomical Society)

Além do ASKAP, os pesquisadores também observaram o objeto com o MeerKAT, um radiotelescópio instalado na África do Sul, bem mais sensível e que permitiria coletar dados mais precisos. Quando ASKAP J173608.2-321635 reapareceu, ele demonstrou outro padrão de comportamento e sumiu um dia depois.

Segundo o artigo, entre 2019 e 2020 o objeto foi observado pelo menos 13 vezes, com períodos de luminescência e de ausência de sinal diferentes entre si, o que o torna completamente imprevisível. Isso descarta a possibilidade de que ele seja uma pulsar, pois embora esta classe de objetos estelares emitam luz polarizada, eles possuem ciclos constantes, funcionando como um relógio.

Além disso, a emissão de uma pulsar dura milissegundos, ela não é constante e irregular, nem dura tempos imprecisos ou leva tempo demais, ou de menos, para aparecer de novo. Considerando tudo o que já se observou do espaço, uma emissão do tipo deveria ter períodos fixos, ao contrário do que acontece.

Claro que muita gente vai dizer que seria uma evidência de uma civilização enviando sinais aleatórios para a periferia da Via Láctea, mas é bom ir devagar com a espaçonave.

Nas séries Império Galáctico e Fundação, Isaac Asimov descreveu Trantor como o planeta mais próximo do centro da galáxia (Crédito: Reprodução/Phantom Four/Skydance Television/Apple) / rádio

Nas séries Império Galáctico e Fundação, Isaac Asimov descreveu Trantor como o planeta mais próximo do centro da galáxia (Crédito: Reprodução/Phantom Four/Skydance Television/Apple)

Ondas de rádio e interferência

O time do Dr. Wang levanta duas hipóteses: uma delas, a mais interessante e ao mesmo tempo a mais improvável, é de que ASKAP J173608.2-321635 seja uma classe completamente nova de objeto estelar, algo que nunca tinha sido encontrado até então.

A outra, que faz bastante sentido, tem a ver com a localização do objeto. Por estar virtualmente no centro da galáxia (cerca de 4º no plano galáctico), é possível que ele seja algo já conhecido, mas que esteja sujeito às grandes forças detectadas anteriormente na região, que incluem a possível existência de um buraco negro super massivo bem no centro, algo já teorizado por astrônomos, graças a emissões conhecidas como "arrotos cósmicos", ejeções de parte da poeira cósmica absorvida pelo seu campo gravitacional.

Pode não ser uma resolução empolgante para quem não é astrônomo, mas se há uma coisa que todos concordam é que o espaço é um lugar muito estranho, e há sempre novas esquisitices com explicações sensatas a serem descobertas.

Referências bibliográficas

WANG, Z. et al. Discovery of ASKAP J173608.2–321635 as a Highly Polarized Transient Point Source with the Australian SKA Pathfinder. The Astrophysical Journal, Volume 920, Edição 1 (outubro de 2021), 22 páginas, 12 de setembro de 2021. Disponível em https://doi.org/10.3847/1538-4357/ac2360

Fonte: The Conversation

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