Carlos Cardoso 3 anos atrás
Séries como Mandalorian às vezes são acusadas de fugir da verdadeira essência do cinema, ao dependerem de efeitos visuais e coisas que não existem, mas em verdade o cinema sempre foi a arte da ilusão, os primeiros filmes de Georges Méliès eram exercícios de tecnologia, criando e implementando trucagens. De certa forma a série de Jon Favreau bebe na mesma fonte do cinema de antigamente, e seu mais avançado recurso tecnológico é um aprimoramento de uma técnica há muito abandonada.
Quando George Lucas precisou de um cenário desértico para representar Tatooine, levou a produção de Star Wars para a Tunísia. Quando precisou de um lugar extremamente frio para ser Hoth, escolheu Curitiba, mas dado o custo-Brasil optou pela segunda opção, Noruega.
Uma série de TV não pode se dar a esses luxos, com cenários mudando a cada episódio os custos seriam astronômicos, e Mandalorian já é a série mais cara da atualidade, custando US$100 milhões por temporada. Mais de US$15 milhões por episódio.
Tradicionalmente esse tipo de filme é feito com tecnologia de tela verde (tecnicamente chromakey se refere somente a vídeo) quando uma imagem é composta trocando um fundo verde por um cenário pré-filmado ou renderizado, isso tem alguns problemas.
Muito é exigido dos atores, que precisam interpretar sem nenhuma referência de cenário ou dos personagens virtuais. É comum termos a impressão de que os atores estão falando para o vazio.
Alguns diretores usam técnicas de pré-visualização para posicionar os atores e compor as cenas em ambientes virtuais, dando a eles uma idéia aproximada do resultado final. Essas técnicas usam em geral gráficos bem crus, é só pra visualizar mesmo.
O que foi feito no Mandalorian foi bem diferente, é o contrário da tela verde, e é baseado na técnica de retroprojeção, inventada na década de 1930. A técnica é bem simples: Você filme uma imagem de fundo, projeta a imagem invertida em uma tela, coloca o ator na frente da tela e pronto, temos uma composição.
Isso foi usado em praticamente todas as cenas de diálogos em carros do cinema, dada a dificuldade de iluminar e capturar áudio em um carro em movimento. Ao invés da rua, o carro fica parado, dentro de um estúdio silencioso, com contra-regras balançando a suspensão e uma tela ao fundo passando a estrada. Isso foi brilhantemente satirizado em Aperte os Cintos: O Piloto Sumiu!
Óbvio, é uma técnica manjada, o resultado é bem falso e ela caiu em desuso, era mais eficiente usar um fundo verde e inserir o cenário na pós-produção, mas eis que várias tecnologias amadureceram, e o resultado é o que a Industrial Light & Magic batizou de... StageCraft.
Ao invés de uma tela de retroprojeção, temos um conjunto de telas de LED envolvendo o cenário, num total de 28Megapixels de resolução. Essas telas rodam uma aplicação usando o engine Unreal, o mesmo dos jogos que a gente tanto gosta.
Os cenários virtuais são projetados em tempo real, com todas as animações, efeitos de luz, tudo.
Agora o melhor de tudo: Não é uma simples tela passando um filme, as animações são renderizadas em tempo real por algo que muito provavelmente deve ser quase capaz de rodar Crysis, e o diretor pode pedir alterações e refinar detalhes ali mesmo.
Neste vídeo da ILM dá pra ver direito como a coisa funciona.
Pelo menos 50% das cenas do Mandalorian foram feitas usando essa tecnologia, e os atores adoram, a imersão é muito mais real, eles conseguem ver aonde estão atuando, e foge-se dos cenários claustrofóbicos.
Fora que há um outro efeito colateral excelente: Essa tecnologia não serve pra filmagem de cenas 3D.
This is the way.