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X é zoado por juiz em processo contra checadores

X processou ONG CCDH por, segundo Elon Musk, encorajar boicote devido posts com discurso de ódio; para juiz, ação não tem mérito

01/03/2024 às 17:06

Em agosto de 2023, o X de Elon Musk abriu um processo contra a ONG Centro de Combate ao Ódio Digital (Center for Countering Digital Hate, ou CCDH), e em novembro do mesmo ano, contra a agência de checagem Media Matters, por estas terem, na conta do bilionário, iniciado uma "campanha de difamação" contra a rede social, levando inúmeros parceiros comerciais a deixarem de anunciar no site.

Ambos órgãos alegam que, desde que o dono da Tesla e SpaceX comprou a plataforma anteriormente conhecida como Twitter, sua gestão não tem combatido, e até incentivou a proliferação de contas e postagens com informações falsas e discurso de ódio. Desde então, companhias como Apple, IBM, Disney não mais lançaram campanhas no X, e Musk respondeu do jeito dele, mandando todo mundo se f#&*r.

Processo do X de Elon Musk contra agência de checagem pode ser arquivado, pois juiz o considera "tedioso" (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Processo do X de Elon Musk contra agência de checagem pode ser arquivado, pois juiz o considera "tedioso" (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

O processo contra o CCDH, que corre no Distrito Norte da Califórnia, está atualmente na fase de audiências, mas o juiz que está cuidando dele considera seriamente arquivá-lo, simplesmente porque, na sua conta, o X não tem um caso sólido, e suas alegações são tentativas de torcer a Lei a favor de Musk. E não poupou papas na língua para ridicularizar a defesa da plataforma.

Musk contra agências de checagem

Desde que assumiu o controle do X em 2022, Elon Musk vem promovendo o que chama de "liberdade de expressão absoluta", o que ele entende que todos, sem exceção, tem direito a voz na rede social. De lá para cá, a rede social teve seus departamentos de moderação e conteúdo encerrados em quase todo o mundo, se removeu de frentes voluntárias de combate a difamação, e contas banidas na gestão anterior, como a congressista republicana Marjorie Taylor-Green, e o ex-presidente dos EUA Donald Trump, foram restauradas.

Até mesmo o perfil do nefasto Alex Jones, que Musk tinha razões pessoais para que continuasse banido, foi restaurado, atendendo a pedidos do público, segundo o executivo.

Claro, na gestão pré-Musk, o Twitter era assumidamente uma plataforma de esquerda, mas a mudança do X, percebida por todos como uma guinada de 180º em direção à extrema-direita, tem tirado políticos e reguladores do sério. Musk e a CEO Linda Yaccarino foram alertados, mais de uma vez, que a plataforma é obrigada por lei a se comportar, mas o bilionário, que tem a palavra final sobre tudo, continua esticando a corda.

Nos processos movidos contra o CCDH e a Media Matters, a defesa do X acusa ambas de formarem um complô para aniquilar a rede social, privando-o de acordos comerciais com anunciantes, que não querem sua imagem associada a uma plataforma que, aos seus olhos, promove Fake News e discursos de ódio dos mais variados. Seus relatórios demonstraram que a rede social está falhando, deliberadamente ou não, em combater tais postagens, e que perfis notórios, alguns de conteúdo claramente nazista, eram inclusive anexados a anúncios.

Tanto o CCDH quanto a Media Matters alegam que os processos movidos pelo X contra ambas entidades é uma manobra de cerceamento e censura, uma forma de silenciar veículos que estão apenas reportando fatos, devidamente verificados, apenas porque eles afetaram seus negócios.

Ambos processos se baseiam em dizer que as ligações entre as postagens com conteúdos de ódio (que são reais) e anúncios foram manipuladas, e que o acesso aos dados do então Twitter violaram os Termos de Serviço da plataforma, o que só se tornou verdade bem depois; na época do acesso, tal uso era legal. Note, ambos processos não são sobre difamação, e voltaremos neste ponto em breve.

Vamos nos focar na audiência do processo do X contra o CCDH, que é onde as coisas ficaram... interessantes.

X no iPhone (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

X no iPhone (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Juiz tira sarro do X

no dia 29 de fevereiro de 2024, o juiz distrital Charles Breyer, da corte da Califórnia, demonstrou pouco apreço pelos argumentos da defesa do X, que sob seu entendimento, não tem mérito. O magistrado deu a entender que pretende arquivar completamente o caso, se analisarmos o que foi dito no tribunal.

Conforme as redes CNN e NPR, presentes na audiência, Breyer se mostrou particularmente interessado em como Jon Hawk, advogado do X, pretende sustentar o argumento de que o CCDH tinha a obrigação de saber que seus relatórios resultariam em prejuízos à companhia a qual representa, pois o proceso alega que tais danos eram "previsíveis".

Hawk alegou que, quando o CCDH aderiu ao então Twitter em 2019, ele concordou com os então vigentes Termos de Serviço da plataforma, especificamente o ponto em que dizia que os termos poderiam mudar. Assim, quando Musk comprou a rede social, e promoveu todas as mudanças que resultaram na restauração de contas outrora banidas, e consequente aumento de postagens de discursos de ódio, a ONG "tinha a obrigação de prever que seus relatórios causariam perdas financeiras" à empresa.

O juiz Breyer teria respondido que estava "tentando formar na cabeça a imagem de que isso (o que Hawk disse) seria remotamente verdade, pois não acho que seja", e seguiu:

"O que você tem que me dizer é 'por que isso é previsível?' (...) O CCDH deveria saber que, no momento em que concordou com os Termos de Serviço, o Twitter iria mudar sua política e permitir que esse tipo de material fosse disseminado?

Isso, obviamente, reduz a previsibilidade a uma das extensões da Lei mais tediosas que já ouvi (...). 'Ah, o que é previsível é que as coisas mudam, e portanto, se mudam, é previsível.' Sério, esse argumento é absolutamente fantástico."

O magistrado apontou a Hawk que o X não entrou com um processo por difamação, porque se o fizesse, as chances de vencer seriam maiores, porém, apontou na lata por que a companhia não o fez: os relatórios do CCDH foram precisos, nenhuma informação ali foi inventada, visto que tudo foi extensamente verificado.

Ainda na mesma audiência, John Quinn, advogado do CCDH, disse que o argumento do X de que a ONG teve acesso não autorizado aos dados da rede social, era "implausível", e que a decisão dos anunciantes em não mais investir na plataforma. Ao mesmo tempo, ações deliberadas do site, como reduzir o alcance de contas e postagens problemáticas, ao invés de eliminá-las, e o tweet antissemita de Musk em novembro de 2023, complicaram ainda mais sua situação junto a parceiros comerciais.

Não há previsão de quando o juiz Breyer deverá decidir sobre o processo, mas dado o seu completo ceticismo em relação à defesa do X, as chances que a ação seja arquivada são grandes, um veredito que pode influenciar o outro contra a Media Matters, que corre na corte distrital de Fort Worth, no estado do Texas.

Fonte: Ars Technica

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