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O anel de galáxias que está tirando o sono dos astrônomos

Com 1,3 bilhão de anos-luz de diâmetro, anel de galáxias não deveria existir, segundo o Princípio Cosmológico... mas existe

17/01/2024 às 10:31

Uma estrutura gigantesca em forma de anel, com 1,3 bilhão de anos-luz de diâmetro e composta por inúmeras galáxias e aglomerados, é a mais nova ocorrência que desafia tudo o sabemos sobre o Universo, incluindo conceitos e leis científicas.

Distante 9 bilhões de anos-luz da Terra, o "Grande Anel", como foi chamado, não deveria existir segundo o Princípio Cosmológico, mas esta não é a primeira vez que algo do tipo acontece. Nem a segunda. Muito menos a terceira.

Fato: o Universo é muito, MUITO mais estranho do que conseguimos imaginar (Crédito: NASA, ESA, CSA, I. Labbe [Swinburne University of Technology], R. Bezanson [University of Pittsburgh]; image processing: Alyssa Pagan [STScI])

Fato: o Universo é muito, MUITO mais estranho do que conseguimos imaginar (Crédito: NASA, ESA, CSA, I. Labbe [Swinburne University of Technology], R. Bezanson [University of Pittsburgh]; image processing: Alyssa Pagan [STScI])

Por estar muito distante da Terra, o Grande Anel não pode ser visto a olho nu, mas caso fosse possível, ele teria um diâmetro no céu noturno equivalente a 15 luas cheias, o que dá uma ideia das dimensões cósmicas com os quais os cientistas estão lidando.

A descoberta foi anunciada durante o 243.º Simpósio da Comunidade Astronômica Americana em New Orleans, realizado entre os dias 7 e 11 de janeiro de 2024, por pesquisadores da Universidade de Central Lancashire (UCLan), no Reino Unido. A importância do Grande Anel para o entendimento do Universo se d[a pelo seu tamanho colossal, que viola o Princípio Cosmológico.

Estabelecido em 1687 por Sir Isaac Newton, quando da publicação de sua seminal Philosophiæ Naturalis Principia Mathematica, ela implica, para o entendimento da maioria dos cientistas, que passado uma determinada escala, a distribuição da matéria pelo Universo possui uniformidade isotrópica, ou seja, é homogênea em todas as direções.

O que a Lei realmente determina, entretanto, é uma questão de observação. Para o astrônomo William C. Keel, por exemplo, o Princípio diz que "visto de uma escala suficientemente grande, as propriedades do Universo são as mesmas para todos os observadores", ou seja, o Cosmos deveria se comportar de forma uniforme a partir de certa escala, pois as Forças primordiais agem para limitar a formação de elementos não-uniformes.

Em tese, o Grande Anel não deveria existir, mas ele não só está lá, nos confins do Universo, como não está sozinho: ele é a sétima estrutura do tipo identificada, e muito similar ao Arco Gigante, descoberto em 2021, que possui uma área de 3,3 bilhões de anos-luz. Ele se encontra "perto" do objeto recém-divulgado, a 9,2 bilhões de anos-luz da Terra, o que sugere a existência de outros fatores, ainda desconhecidos.

Tanto o Grande Anel quanto o Arco Gigante foram identificados pela equipe da Me. Alexia Lopez, doutoranda do Instituto Jeremiah Horrocks da UCLan. Ela acredita que, talvez, o Universo observável nunca jogou dentro das regras do Princípio Cosmológico, que limita a formação de estruturas cósmicas a não mais de 1,2 bilhão de anos-luz de extensão.

Representação artística de como ficariam o Grande Anel (azul) e o Arco Gigante (vermelho) no céu noturno, caso fossem visíveis a olho nu (Crédito: Stellarium/University of Central Lancashire/PA)

Representação artística de como ficariam o Grande Anel (azul) e o Arco Gigante (vermelho) no céu noturno, caso fossem visíveis a olho nu (Crédito: Stellarium/University of Central Lancashire/PA)

Embora o Grande Anel, que não é um círculo perfeito, ao invés disso, possui a forma espiralada de um saca-rolhas (sua face está voltada em nossa direção), tenha passado do limite "por pouco", o Arco Gigante é quase três vezes maior, e definitivamente não deveria existir, mas existe. Ambos se encontram próximos da constelação de Boötes, o Boieiro, sugerindo que as Forças ali presentes favoreceram a formação de ambas estruturas, que reúnem galáxias e aglomerados.

Há a possibilidade de que o Grande Anel e o Arco Gigante, dada a proximidade, sejam partes de uma estrutura ainda maior, e se você achou 4,6 bilhões de anos-luz muito, saiba que a maior já catalogada, a Grande Muralha Hércules-Corona Borealis, se estende por 10 bilhões de anos-luz; vale lembrar que o diâmetro calculado do Universo observável é de 93 bilhões de anos-luz.

Segundo o prof. Dr. Don Pollacco, do departamento de física da Universidade de Warwick, é difícil até mesmo conceber os mecanismos por trás da formação de tais estruturas, no que ele especula serem relíquias do Universo primitivo, no que ondas de material de alta e baixa densidade estariam "congeladas" em um meio extragaláctico, ainda não devidamente identificado.

Claro, o Universo é um lugar enorme e muito estranho, e tentar adequá-lo às nossas observações pode levar a conclusões errôneas. David Hume apontou isso com seu Problema da Indução, exemplificado de forma didática em Três Corpos, com a história dos perus.

Estamos observando o Cosmos com tabuletas de argila, inferir que nossas observações ditam como ele funciona pode ser não apenas errado, mas uma demonstração colossal de arrogância. O Grande Anel e outras estruturas do tipo são um lembrete de que, talvez, mal tenhamos arranhado a superfície do Universo, quiçá determinar como ele funciona.

Fonte: University of Central Lancashire

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