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UE: Apple pode ser 1.ª empresa multada por descumprir nova Lei

UE diz que Apple viola Lei de Mercados Digitais, ao cobrar taxas de compras in-app fora da App Store; multa pode chegar a US$ 50 milhões/dia

18/06/2024 às 10:37

A Apple pode vir a se tornar a primeira companhia multada na União Europeia (UE), por desrespeitar a Lei de Mercados Digitais (DMA), que define as regras e limites do que as big techs podem, e não podem, fazer no bloco. Sob a legislação, a companhia é obrigada a permitir lojas de aplicativos concorrentes no iOS e iPadOS, bem como liberar o sideloading (instalação manual) de apps aos usuários.

A maçã, que odeia perder dinheiro, seguiu a Lei "do seu jeito", e implementou cobranças de taxas e comissões em cima de compras in-app e instalações de aplicativos por meios alternativos, o que os legisladores europeus entenderam como uma violação flagrante da DMA, no que a Apple poderá ter que pagar US$ 50 milhões de multa. Por dia.

Apple aceitou permitir compras in-app por fora da App Store, mas quer cobrar taxas mesmo assim; a UE, claro, não gostou (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Apple aceitou permitir compras in-app por fora da App Store, mas quer cobrar taxas mesmo assim; a UE, claro, não gostou (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Apple pode levar multa diária da UE

A DMA é essencialmente um pacote antitruste, criado para restringir o domínio das grandes companhias de tecnologia nos 27 países-membros do bloco, em especial Apple, Google, Meta, Amazon e Microsoft, além da chinesa ByteDance, dona do TikTok, de modo a aumentar a competição e favorecer as empresas locais.

As seis empresas acima mencionadas foram enquadradas como gatekeepers, e submetidas a regras ainda mais duras que as demais, que incluem:

  • Privilegiar produtos e serviços em seu próprio hardware e soluções é proibido;
  • Apps pré-instalados devem permitir remoção ao usuário, sem exceções;
  • Mensageiros instantâneos deverão todos conversar entre si, e ficam proibidos de limitar recursos a plataformas e hardware específicos;
  • Empresas externas deverão ter acesso a todos os dados que geram nos serviços fornecidos pelas gatekeepers;
  • Dados de usuários europeus não podem ser usados para exibição direcionada de anúncios, a menos que estes autorizem de forma expressa.

A DMA é aplicada de modo a se adequar aos serviços-alvos. TikTok, Facebook, Instagram e LinkedIn, por exemplo, são proibidos de impedir que redes sociais concorrentes, como o X do bilionário Elon Musk (que não foi enquadrado como gatekeeper, mas tem sua própria cota de problemas com a UE), ou outras de origem europeia (cenário preferencial), exibam anúncios direcionados entre suas postagens.

Apple e Google também não podem fixar respectivamente o Safari e o Chrome como navegadores padrão no iOS, iPadOS e Android, assim como a Microsoft já não podia fazê-lo no Windows, e todos são forçados a exibir ao usuário uma tela para que ele escolha o seu preferido, e também defina seu motor de busca de preferência (o Google também não pode forçar o uso do Search), na primeira inicialização do dispositivo ou sistema operacional.

A Amazon também fica proibida de privilegiar anúncios da linha Kindle em seu site de e-commerce, assim como o Google não pode bloquear propagandas de concorrentes ao Ads, ou anúncios de buscadores rivais em seu próprio motor.

Enfim, a lista de exigências é imensa, e a UE é adamante: todo mundo é OBRIGADO a seguir a lei, seja quem for; quem não estiver satisfeito, que saia da Europa, e ninguém é idiota a ponto de renunciar a um continente inteiro de consumidores. Logo, todo mundo dança conforme a música. Ou quase todo mundo.

Tanto a Apple quanto o Google são forçados pela DMA a permitir a presença nativa de apps de lojas de terceiros, no iPhone, iPad e Android, e liberar a cobrança alternativa aos desenvolvedores, de modo que elas possam contornar o sistema nativo de pagamentos, a fim de não pagar comissões a ambas empresas; a maçã ainda tem que seguir uma exigência adicional, que é liberar o sideloading, a instalação manual de um arquivo de app, ao consumidor, um procedimento disponível desde sempre a usuários dos dispositivos móveis que rodam o sistema da gigante das buscas.

O problema, a Apple decidiu que ela tem o direito de continuar cobrando comissões e taxas dos desenvolvedores, em ambos cenários.

A Apple de Tim Cook não se tornou a 1.ª companhia a atingir o valor de mercado de US$ 3 trilhões, abrindo mão de comissões; quem não quiser pagar, que saia do iPhone (Crédito: Reprodução/The Wrap)

A Apple de Tim Cook não se tornou a 1.ª companhia a atingir o valor de mercado de US$ 3 trilhões, abrindo mão de comissões; quem não quiser pagar, que saia do iPhone (Crédito: Reprodução/The Wrap)

Como bem sabemos, cada movimentação financeira em um aplicativo do iPhone gera uma comissão de 30% à Apple, que desenvolvedores consideram abusivas e não querem pagar. A DMA força a companhia a permitir que os estúdios implementem suas próprias opções de cobrança, sem que estas gerem a taxa.

Cupertino permitiu que os apps façam isso, mas sob o pagamento de uma nova comissão, de 12% sobre compras in-app de estúdios e desenvolvedores que fazem parte de seu programa voltado a pequenas empresas, e de 27% dos demais, onde um de seus maiores desafetos atuais, a Epic Games, se enquadra.

Com as novas regras, a economia ao adotar o método alternativo de cobrança fica entre 3% para grandes empresas e pequenos não-parceiros, e 18% para quem faz parte do programa. Para serem elegíveis, os desenvolvedores são obrigados a submeterem relatórios de vendas alternativas, para que ela calcule o valor devido.

Com o sideloading, que a Apple odeia desde sempre, ela foi ainda mais mesquinha: a opção é restrita à UE, mas aqueles que optarem por distribuir seus apps e games por fora da App Store, para que o usuário baixe-os e instale-os por conta própria, podem optar por comissões menores a serem pagas, de entre 10% e 17%, dependendo da categoria, além de uma taxa adicional de 3%, de processamento sobre compras in-app; de novo, a maçã exige a submissão de relatórios de vendas, para que os apps sejam elegíveis; do contrário, eles não podem ser instalados manualmente.

Piora, claro: apps e games populares, que ultrapassem a marca de 1 milhão de downloads, não importa se por dentro ou por fora da App Store, terão que pagar outra comissão, chamada Taxa Sobre Tecnologias Essenciais (Core Technology Fee, ou CTF), no valor de 0,50 € (~R$ 2,91, cotação de 18/06/2024) por instalação, todos os anos.

Ah, sim: atualizações de apps fornecidas via OTA também entram na conta da quantidade de downloads.

Convém lembrar que o Google está fazendo a exata mesma coisa, cobrando taxas sobre compras realizadas por fora de seu sistema de pagamentos; já sobre o sideloading, embora a companhia o mantenha como um recurso nativo, ela sempre o defendeu como de uso restrito a desenvolvedores, e fez das suas para frear sua adoção pelo usuário final.

Fato: a Apple ODEIA sideloading (Crédito: Reprodução/Web Summit)

Fato: a Apple ODEIA sideloading (Crédito: Reprodução/Web Summit)

A grande verdade, a Apple não admite a possibilidade de deixar de tirar a sua parte, e defende com unhas e dentes que o controle de suas plataformas cabe a ela e ninguém mais, não importa o que legisladores digam, ou a forcem a fazer. Essa atitude de distorcer as Leis a seu favor já está lhe causando problemas com a Justiça dos Estados Unidos, inclusive.

Agora o caldo entornou na UE, também. Embora tenha demorado a tomar uma posição, a Comissão Europeia, o braço executivo do bloco, iniciou em março de 2024 uma investigação formal contra Apple, Alphabet Inc./Google e Meta, por supostas violações da DMA; a empresa de Mark Zuckerberg entrou na mira graças à estratégia que força o usuário a pagar para não ter seus dados coletados.

Nesta semana, a Comissão apresentou resultados preliminares envolvendo a maçã, demonstrando que, ao insistir em cobrar taxas por procedimentos e distribuição de apps alheios a seus sistemas de pagamento, ela continua prejudicando a competição (as regras são tão onerosas, que todos preferirão continuar dentro da App Store), e dessa forma, não está cumprindo o que a Lei determina: liberar pagamentos externos e o sideloading, sem cobrar nada por isso.

Como as conclusões ainda são preliminares, a Apple teria tempo de se emendar e cancelar a cobrança das novas taxas, a fim de evitar punições, mas vendo que a empresa está tentando usar o Campo de Distorção da Realidade no 11 nos EUA, contra a juíza Yvonne Gonzalez Rogers, da Corte Distrital do Norte da Califórnia (o que não está dando certo, diga-se de passagem), é bem provável que a gigante tentará a mesma estratégia na Europa.

Dessa forma, a Apple tem chances reais de se tornar a primeira big tech multada sob a vigência da DMA, no que ela seria obrigada a pagar uma quantia diária por descumprimento da Lei, enquanto não se adequar, equivalente a 5% de seu faturamento diário médio global, que hoje gira na casa de US$ 1 bilhão; assim, a maçã teria que desembolsar US$ 50 milhões por dia e repassar à UE, enquanto não eliminar as novas taxas.

A quantia pode parecer baixa, e é, mas a DMA prevê também punições mais severas, como uma multa fixa de 10% do faturamento global anual, aumentando para 20% no caso de reincidência, o que com base nos resultados financeiros da Apple de 2023, ficaria em US$ 38,3 bilhões e US$ 76,6 bilhões, respectivamente. Esses, sim, são valores que doem no bolso.

A Apple, para variar, não se manifestou a respeito.

Fonte: Ars Technica

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