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Efeito Estufa e o quão fácil é destruir um planeta

Elevação da temperatura global em alguns graus desencadearia processo descontrolado do Efeito Estufa na Terra, que acabaria igual a Vênus

11 semanas atrás

Fato: o Efeito Estufa é um fenômeno essencial para a manutenção da vida na Terra. Sem o "cobertor" que é nossa atmosfera, capaz de reter parte do calor proveniente da luz do Sol e outros fatores, o planeta congelaria. Igualmente fato, há um tênue equilíbrio que precisa ser mantido, um aumento do efeito levaria ao descontrole de todo o sistema, com resultados apocalípticos.

Vênus é o exemplo mais próximo do que pode acontecer com a Terra, caso o Efeito Estufa saia do controle. Com uma temperatura média acima de 400º C, ele é atualmente o planeta mais quente do Sistema Solar, superando até mesmo Mercúrio, cuja órbita é a mais próxima do Sol. Agora, uma simulação mostrou que os fatores necessários são menos complicados do que se pensava.

O Efeito Estufa é essencial para a vida na Terra, mas você não vai querer que ele degringole (Crédito: Shutterstock)

O Efeito Estufa é essencial para a vida na Terra, mas você não vai querer que ele degringole (Crédito: Shutterstock)

Simulando um Efeito Estufa descontrolado

Um recente estudo (cuidado, PDF), de pesquisadores da Universidade de Genebra, na Suíça, contou com uma mãozinha do Centro Nacional para Pesquisa Científica da França (CNRS), que forneceu os laboratórios de Paris e Bordeaux para rodar a primeira simulação completa de todo o processo de descontrole do Efeito Estufa. Em situações normais, o fenômeno retém parte do calor no planeta, mantendo a água em estado líquido e propiciando o desenvolvimento da vida.

Em um cenário em que as coisas começam a sair do controle, a composição da atmosfera aumenta, passando a se tornar tão densa que impede parte do calor de se esvair, o que é necessário para que as temperaturas se mantenham estáveis. Com um Efeito Estufa mais intenso, as temperaturas sobem e mais vapor de água, além de metano, dióxido de carbono e outros gases, todos geradores do efeito, se acumulam cada vez mais nas camadas superiores, criando um ciclo permanente de feedback (retroalimentação) positivo.

Como resultado, a atmosfera se torna tão densa e espessa, que todo o calor gerado não escapa, levando à evaporação dos oceanos e a temperaturas altíssimas; de fato, Vênus pode muito bem ter sido similar à Terra bilhões de anos atrás, antes do Efeito Estufa se intensificar. Hoje, além das temperaturas altas, o planeta conta com ventos de mais de 400 km/h, chuvas de ácido sulfúrico, e uma pressão atmosférica 92 vezes maior que a nossa. Definitivamente, não é um lugar legal para visitar.

O modelo simulado pelos pesquisadores usou um exoplaneta similar à Terra, e após submetê-lo a um aumento significativo da luminosidade fornecida pelo Sol, o processo tresloucado de feedback é disparado, de tal forma que é quase impossível de revertê-lo. O cenário de retroalimentação é basicamente a Caixa de Pandora: uma vez aberta, não tem volta.

A atmosfera de Vênus é composta principalmente de dióxido de carbono, um dos principais gases causadores do Efeito Estufa, mas a pesquisa percebeu que o vapor d'água desempenha um papel fundamental no processo de descontrole. Sua presença em maiores quantidades aumenta também a temperatura, que leva ao aquecimento dos oceanos e liberação de mais vapor, mantendo o loop ad aeternum, até toda a água evaporar e se manter assim. Como em Vênus.

O que os cientistas observaram, durante a simulação, foi a formação de nuvens peculiares muito densas, eliminando a inversão de temperatura entre a estratosfera e a troposfera e alterando profundamente a estrutura clássica da atmosfera.

Segundo o dr. Guillaume Chaverot, pós-doutorando de Astrofísica e um dos autores do estudo, "é preciso muito pouco" para converter um mundo habitável em um inferno: a simulação estabeleceu o "limiar" do apocalipse, a temperatura a partir da qual não é mais possível resfriar o planeta, e o aquecimento só aumentará até a catástrofe final, que desse ponto em diante, passa a ser inevitável. E não estamos muito longe da marca.

Gráfico com oscilação das temperaturas médias da Terra, de 1880 até hoje, em Celsius (Crédito: U.S. National Oceanic and Atmospheric Administration - NOAA)

Gráfico com oscilação das temperaturas médias da Terra, de 1880 até hoje, em Celsius (Crédito: U.S. National Oceanic and Atmospheric Administration - NOAA)

Enquanto cientistas e ativistas alertam governos e corporações para fazerem o possível e manterem o acréscimo nas temperaturas médias a até 1,5º C pelos próximos 5 anos, a pesquisa de Chaverot e seus pares mostra que mesmo esse índice já é bastante ruim. Conforme a simulação, um adicional de 10º C (o que é muita coisa, diga-se de passagem) é hoje o limite para disparar o feedback positivo na Terra, de forma que o processo de descontrole do Efeito Estufa não poderá mais ser combatido.

Nesse cenário, uma quantidade significativa da água evaporaria, e uma vez que os oceanos recuem em 10 metros, a pressão atmosférica da Terra subiria em 1 bar. A título de comparação, hoje ela é 1,01325 bar; em alguns poucos séculos, o feedback e evaporação da água elevariam a temperatura média do planeta para aproximadamente 500º C, mas até chegar nesse nível, já não haveria mais nada vivo por aqui.

Conforme o time de pesquisadores, a simulação é importante para o estudo de exoplanetas, em especial a busca por outros mundos que ofereçam condições climáticas ideais, e, ao mesmo tempo, oferece novas perspectivas para o estudo do aumento do Efeito Estufa na Terra, da participação dos gases criados pelo homem e outros fatores artificiais, e sua capacidade de desencadear o processo destrutivo da mesma forma que o aumento da luminosidade solar.

Referências bibliográficas

CHAVEROT, G., BOLMONT, E., TURBET, M. First exploration of the runaway greenhouse transition with a 3D General Circulation Model. Astronomy & Asthophysics, Volume 680 (dezembro de 2023), 15 páginas, 18 de dezembro de 2023. Disponível aqui.

Fonte: Université de Genève

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