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IA: SoftBank vai alterar seu tom de voz em ligação para o SAC

SoftBank anuncia IA para "alterar emoções" no tom de voz de usuários em ligações ao SAC, para soarem calmos e não estressarem os atendentes

19/06/2024 às 10:30

Outro dia, outro uso da Inteligência Artificial (IA) visando trazer benefícios a empresas, mas que pode deixar algumas pessoas cabreiras: o SoftBank, grupo japonês de investimentos que controla a ARM, anunciou o desenvolvimento de um algoritmo para alterar o tom de voz de pessoas em áudio, em tempo real.

Segundo o grupo, a ferramenta será voltada a amenizar o tom de usuários em ligações ao Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC), para reduzir o estresse dos atendentes que, de fato, não são responsáveis pelos problemas do cliente raivoso do outro lado da linha.

Pode gritar o quanto quiser: graças à IA, o atendente do outro lado da linha vai te ouvir calminho, calminho (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Pode gritar o quanto quiser: graças à IA, o atendente do outro lado da linha vai te ouvir calminho, calminho (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

IA, um calmante para clientes furiosos

A tecnologia, chamada SoftVoice, está sendo desenvolvida pelo departamento de Tecnologia para Conversão de Voz com IA do Grupo SoftBank. Apresentada pelos pesquisadores Toshiyuki Nakatani, Toshio Imamura e Shuhei Takahara, ela é descrita como um algoritmo de "cancelamento de emoções", e os estudos a respeito teriam sido iniciados em 2021.

O time de pesquisa, liderado por Nakatani, usou uma base de dados com mais de 10.000 amostras de diálogos, produzidas por 10 atores japoneses diferentes, expressando mais de 100 frases em diversos tons, desde gritos ao uso de tom acusatório, para que o algoritmo mastigasse tudo e montasse um padrão de reconhecimento.

Com ele, o SoftVoice é capaz de identificar, em tempo real, quando uma pessoa está usando um tom de voz agressivo ou hostil, e nesse caso, ele aplica modificações no tom, altura do áudio, e inflexão da voz do usuário, fazendo com que o áudio de uma pessoa furiosa, soe para o atendente do call center como um cliente calmo e tranquilo.

O algoritmo, na verdade, foi desenvolvido para normalizar tons de voz que considere dissonantes. Por exemplo, a IA pode identificar uma voz de um cliente que fala baixo demais, ou com um ritmo lento, e ajustar o volume e a inflexão verbal, para que o atendente possa entender melhor. Porém, o SoftBank é bem claro que o SoftVoice nasceu principalmente para diminuir o estresse dos atendentes de SACs.

O grupo avisa que o conteúdo do áudio não é alterado, e um "certo tom" de agressividade será mantido após o tratamento do SoftVoice, para que o atendente seja capaz de identificar que o cliente está irritado; isso é necessário para garantir uma maior eficiência no atendimento, e medir a urgência do mesmo.

O SoftBank defende a necessidade da ferramenta de IA, para combater o crescente número de casos de kasu-hara, corruptela local de customer harassment, assédio por parte do consumidor. Tal ato envolve a conduta de um cliente em que ele tenta intimidar, abusar, ameaçar, ou exercer superioridade (a famosa carteirada, o "você sabe com quem está falando?") contra um prestador de serviço. Geralmente, as vítimas são trabalhadores sempre na base da pirâmide, como atendentes de call centers, vendedores de lojas, recepcionistas, funcionários que auxiliam no fluxo de passageiros em estações de trem, etc.

SoftVoice é basicamente um filtro (Crédito: Divulgação/SoftBank Corp.)

SoftVoice é basicamente um filtro (Crédito: Divulgação/SoftBank Corp.)

O problema tomou proporções tão grandes, que o governo japonês estuda passar novas leis, para proteger os trabalhadores em situações envolvendo o kasu-hara.

Como previsto, o anúncio do SoftVoice não agradou todo mundo. Alguns apontam não ser uma boa ideia aplicar um filtro de emoções entre o cliente e o atendente, por mais estressante que a comunicação possa ser, porque a voz atenuada "não reflete a realidade" do consumidor, sendo assim a "pior solução" possível.

No Reddit, um usuário lembrou do notório caso de suicídios nas fábricas da Foxconn na China, onde o iPhone é montado, com funcionários pulando das janelas, em que a "solução" para o problema foi colocar redes ao redor do prédio. Neste caso específico, raiva e frustração são respostas legítimas à prestação de serviços ineficiente ou precária, algo que o brasileiro conhece muito bem, tanto com serviços privados quanto com estatais (especialmente o segundo caso).

Outros apontam o óbvio, a IA será usada por companhias para economizar dinheiro, empregando o SoftVoice e similares (claro que eles surgirão, em algum momento) para tratar o sintoma, a raiva, mas não a origem do problema. Enquanto o financeiro reduz casos de estresse de atendentes, o que pode se refletir em queda de produtividade e em casos mais graves, licenças médicas, o usuário nervoso continuará com seu problema sem solução, pois a comunicação com tom amenizado será entendida pelo funcionário como um atendimento de baixa prioridade, poupando mais grana.

A SoftBank pretende introduzir oficialmente o SoftVoice durante próximo ano fiscal, entre abril de 2025 e março de 2026, e espera que a IA "crie um ambiente de trabalho mais seguro, que permita aos trabalhadores entregarem um melhor serviço aos consumidores". Embora a intenção seja boa, como a tecnologia será usada no mundo real, só o tempo dirá.

Fonte: SoftBank News, The Asahi Shimbun

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