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Pessoas acham já saber o que é preciso para tomar decisões

Maioria das pessoas tende a achar que sabem o necessário para tomar decisões, ao receberem informações parciais e/ou enviesadas

15/10/2024 às 10:17

Você provavelmente já ouviu falar do efeito Dunning-Kruger, o viés cognitivo em que pessoas com baixa expertise em algo tendem a achar serem mais capazes do que são, enquanto os com mais habilidade e conhecimento subestimam suas capacidades, o que pode ser traduzido como "quanto mais você aprende sobre um tema, menos você acha que sabe sobre ele".

Agora, um novo estudo estabeleceu um viés complementar, embora seja algo que muita gente já sabia: humanos têm uma forte tendência a acreditar que já sabem todo o necessário para a tomada de uma decisão sobre um determinado assunto, independente da quantidade de informações que recebeu, e de como elas lhe foram fornecidas.

Pessoas tendem a acreditar que sabem tudo sobre um assunto, independente de quão informadas sejam (Crédito: DigitalVision Vectors/Getty Images)

Pessoas tendem a acreditar que sabem tudo sobre um assunto, independente de quão informadas sejam (Crédito: DigitalVision Vectors/Getty Images)

A pesquisa (cuidado, PDF), publicada na PLOS One e de acesso aberto, foi conduzida por três pesquisadores, os Drs. Hunter Gehlbach, Carly Robinson, e Angus Fletcher, de respectivamente Johns Hopkins, Harvard, e Universidade de Ohio. O experimento é basicamente uma extensão do Dunning-Kruger, para avaliar se indivíduos são capazes de perceber que receberam apenas informações parciais e/ou enviesadas, antes de serem solicitados a tomarem decisões baseadas nelas.

A proposta era bem simples, na verdade. O cenário proposto envolvia um distrito escolar, onde um problema constante de falta de água levou a direção de uma escola a considerar o fechamento, e transferir os alunos para outra unidade, unindo as turmas às que lá estudam. Um artigo foi escrito baseado nessa premissa, e ele incluía sete comentários adicionais: três a favor da fusão das turmas, três contra, defendendo que ambas escolas deveriam permanecer abertas, e um neutro.

Os voluntários foram divididos em três grupos: um controle, que recebeu o artigo na forma integral, e outros dois que tiveram acesso a uma versão editada, um que incluía apenas os comentários a favor da fusão e o neutro, enquanto o outro, apenas os contra e o neutro.

Como esperado, os voluntários do grupo controle, que leram todas as informações existentes disponíveis, apresentaram um resultado esperado, com pouco mais da metade a favor da fusão, já os grupos experimentais apresentaram resultados curiosos. No grupo que leu apenas as opiniões a favor, quase 90% defenderam a fusão das turmas; entre os que receberam apenas os comentários contra, esse número cai para menos de 25%.

Após manifestarem suas decisões, metade dos membros dos grupos teste receberam um questionário, perguntando se eles tinham informações suficientes para tomar uma decisão, se eles tinham confiança nelas, e se esperavam que mais pessoas concordassem com eles.

Pesquisadores apontam que comportamento é problemático no cenário atual, com desinformação por todos os lados (Crédito: Vika_Glitter/Pixabay)

Pesquisadores apontam que comportamento é problemático no cenário atual, com desinformação por todos os lados (Crédito: Vika_Glitter/Pixabay)

Em geral, os voluntários responderam que já tinham "toda a informação necessária" para a tomada de uma decisão, se mostraram tão confiantes quanto o grupo controle, de que a maioria das pessoas concordaria com eles, e se mostraram mais confiantes do que aqueles que leram o panorama completo, sobre estarem certos em suas decisões.

A outra metade dos voluntários nos grupos teste recebeu a outra versão enviesada do artigo, a que continha as três opiniões contrárias às que receberam originalmente e a neutra, e só então o questionário. Essas pessoas, que leram de certa forma o artigo original, ainda que "fragmentado", apresentou posteriormente opiniões muito mais próximas às do grupo controle, ou seja, as pessoas ainda tendem a mudar de opinião, quando lhe é apresentado o cenário completo sobre uma situação.

Gehlbach, Robinson e Fletcher dizem inclusive que, embora as pessoas tendam a mudar de opinião, e mesmo agindo como se já tivessem todas as informações desde o início, quando só tiveram acesso a elas após tomarem a decisão inicial, esse viés cognitivo é visto como um comportamento preocupante, pois pessoas entram na fase de julgamento e tomada de decisão, mesmo não sabendo tudo sobre uma história ou situação.

Os pesquisadores apontam para a óbvia situação atual, com veículos de mídia, influenciadores, redes de informação e afins despejando todos os tipos de histórias e factoides, parciais e enviesados, esperando moldar as opiniões e decisões da maneira que desejam, contando com a apresentação parcial de informações, já que o cidadão médio não busca se inteirar mais, pois ele "já sabe tudo".

Referências bibliográficas

GEHLBACH, H., ROBINSON, C. D., FLETCHER, A. The illusion of information adequacy. PLOS One 19 (10): e0310216, 12 páginas, 9 de outubro de 2024.

DOI: 10.1371/journal.pone.0310216

Fonte: Ars Technica

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