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Software Livre e Receita Federal - Causa certa, argumento errado

17 anos atrás

Estava indo para o trabalho hoje quando deparei com um artigo no INFOetc do jornal O Globo sobre as reclamações da Fundação Software Livre da América Latina (FSF-LA) em relação à teimosia da Receita Federal não abrir o código-fonte do programa IRPF.

Estou de acordo com maior transparência em relação a software que afeta milhões de pessoas, mas quando leio um argumento como o transcrito abaixo, lembro da entrevista no Programa do Jô, do cara defendendo software livre falando de compiladores:

Para evitar tais riscos, o contribuinte deveria poder "inspecionar os programas oferecidos pela Receita Federal ou implementar seus próprios, de acordo com especificações que a própria Receita Federal deveria publicar no tocante a formatos de arquivos, protocolos de comunicação e requisitos para validação de declarações e recibos..."¹

Minha nossa, o contruibuinte além de sofrer com a mordida do Leão no órgão mais sensível do corpo humano, o bolso, vai querer programar o próprio software para entrega da declaração de impostos? A FSF de vez em quando viaja na maionese...

O desejo de ter as regras de validação abertas poderia abrir um mercado para softwares financeiros, serviços web, serviços empresariais de consultoria financeira feito por empresas, etc. Esse é o tipo de argumento que precisa ser defendido. Geração de empregos e expertise na área tributária é algo que pode ser explorado.

Um contador não quer nem ouvir falar de alguém refazendo um programa pronto, ou baixar um software livre meia boca feito em java, por causa de filosofias tecnológicas.

Converse com o administrativo de uma empresa e a primeira pergunta vai ser: e o custo? A segunda: é seguro? E a terceira: se algo der errado na validação, quem paga o pato?

Com exceção de empresas que possam estar interessadas em melhorar o que o SERPRO já faz por excelência, o programa precisaria ser atualizado todos os anos e só seria realmente útil durante alguns meses. Agora eu pergunto: levante a mão quem se dispõe a manter um software notadamente complicado, com regras de negócio ultra complexas por convicções ideológicas?

A causa está certa, mas o argumento deles está equivocado em apontar uma "vontade" dos usuários em criar o seus próprios programas. O que o contribuinte quer mesmo é cada vez mais facilidades, como poder declarar os impostos de qualquer sistema operacional. Se uma equipe de programadores for capaz de deixar o programa IRPF mais fácil de usar, melhor ainda.

Dizer que usar software proprietário é "prejudicial" (a quem? como?) e "moralmente condenável" já perdeu pontos. Ao invés de criticar a forma de distribuição, a FSF-LA poderia listar quais os benefícios diretos e indiretos a comunidade poderia trazer, como contribuições de código e redução dos custos de desenvolvimento. O SERPRO agiria como validador dessas implementações e controle de qualidade. Eles, inclusive, possuem uma forte cultura de software livre.

E um último detalhe, o IRPF é desenvolvido com recursos do governo, o que o torna um software da União e não de uma empresa de quinta categoria malvadona que come programadores open source no café da manhã.

Fonte:
1. MACHADO, André. Um Programa Imposto? O Globo, Rio de Janeiro, 5 mar. 2007. INFOetc, p. 1, 4.

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