Threads of Time e o risco de mirar em um gigante

Há quem diga que a expectativa é a mãe da decepção (raciocínio com o qual, admito, sempre concordei). E quando se trata de anunciar um jogo, uma das maneiras mais fáceis de chamar a atenção do público — e colocar um enorme alvo nas próprias costas — é comparar sua criação a um dos maiores do gênero. Pois os responsáveis pelo Threads of Time fizeram isso, o que me faz questionar: será que o RPG aguentará o peso da cobrança que receberá?

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Crédito: Divulgação/Riyo Games

Desenvolvido pelo estreante estúdio canadense Riyo Games, que afirma que sua missão é “criar RPGs com inspiração retrô que desperte memórias preciosas da infância”, Threads of Time foi anunciado na Tokyo Game Show, sendo fácil perceber de qual fonte ele mais bebeu.

Embora sua página no Steam nunca cite o Chrono Trigger, de sua estética até enredo, não resta dúvida de que um dos maiores jogos de todos os tempos também é um dos favoritos dessa equipe. Veja, por exemplo, como ele é descrito na loja da Valve:

“Aventura de viagem no tempo: de uma era onde dinossauros vagam até o distante futuro e reinos alternativos entre eles. Viagem por eras fantásticas e distintas, e descubra os fios que formam as eras.

Desvende um conto épico de destinos entrelaçados e segredos que moldam civilizações... e siga os fios de uma trama sinistra que atravessa a tapeçaria do tempo.

Heróis de várias eras: reúna uma equipe de personagens únicos e carismáticos, recrutados de diferentes eras. Restaure a antiga Ordem dos Cavaleiros Temporais e reúna heróis de várias épocas para defender a linha do tempo do caos e corrupção iminente.”

Threads of Time também aproveitará outras características típicas da época em que o clássico da Square foi lançado, com a principal delas sendo as batalhas por turnos. Segundo o pessoal da Riyo Games, no jogo poderemos moldar o tempo como quisermos e criar combos com os membros da nossa equipe.

Contudo, apesar de o jogo contar com personagens desenhados com a boa e velha pixelart, a desenvolvedora aproveitou a tecnologia atual para entregar uma experiência visualmente mais moderna. Criado com a Unreal Engine 5, o seu trailer mostra como a fusão de antigo com o novo pode gerar um resultado muito bonito, parecido com o que a Square Enix tem criado com o estilo HD-2D. Confira:

Tudo isso posto, não surpreende tantas pessoas terem ficado empolgadas com o anúncio do Threads of Time. O jogo está muito bonito, seus personagens exalam um carisma que só seria possível com esse tipo de gráficos e ele poderá ter um sistema de batalhas que as tornem divertidas e variadas.

Mas como questionei antes, será que seus criadores não estão arriscando demais ao apostar em algo tão parecido? Quando o título finalmente for lançado numa data ainda desconhecida e por enquanto apenas para PC e Xbox Series S|X, será que, por melhor que ele seja, as pessoas não o acusarão de não passar de uma cópia daquele que o inspirou?

Obviamente ainda é muito cedo para podermos responder essas questões, mas saber da existência desse projeto imediatamente me fez lembrar de outros três títulos que, em maior ou menor grau, também tiveram o Chrono Trigger como ponto de partida: Timespinner, Sea of Star e Chained Echoes.

Crédito: Divulgação/Riyo Games

No caso do primeiro, ele foi o menos elogiado pelas pessoas que o experimentaram, sendo também o mais diferente do trio. Contudo, mesmo funcionando como um metroidvania, o jogo lembrava bastante a antiga história sobre viagens no tempo estrelada por Chrono, principalmente na sua parte visual. Já os outros dois seguiram por um caminho menos ousado, apostando em RPGs tradicionais, o que de forma alguma os torna menos interessantes.

Eu não vejo problema algum em jogos serem influenciados por outros. É comum artistas tentarem replicar aquilo que tanto gostam e para quem nunca conseguiu saciar sua sede de Chrono Trigger, qualquer projeto que o tenha como alvo será suficiente para despertar o interesse.

Porém, é preciso que seus criadores tenham cuidado, pois mais importante do que alcançar sua inspiração é criar algo divertido, com personalidade e novidades suficientes para que o jogo não seja tratado como uma imitação sem criatividade.

Crédito: Divulgação/Riyo Games

Segundo Charles Cecil, criador da série Broken Sword, os desenvolvedores precisam se dedicar a gêneros que gostam, pois caso contrário, eles falharão. Contudo, “quando você estiver tendo ideias, tente manter em mente todas as coisas que ama sobre o gênero e inove nelas, adicione-as de uma forma interessante,” defendeu. “Você precisa focar naquilo que ama, mas [o jogo] tem que ser sobre as mecânicas [...], tudo precisa ser sobre a jogabilidade.”

Pois torço para que o pessoal da Riyo Games tenha adotado essa lição em seu atual projeto e espero também que a falta de personalidade não afete o Threads of Time. Se isso se confirmar, acredito que provavelmente teremos um excelente título.

Como diz uma frase que já vi ser atribuída a diversos autores, “a imitação é a mais sincera forma de elogio.” No entanto, no caso de tentar mirar em uma unanimidade como Chrono Trigger, a expectativa que acompanha essa iniciativa pode mesmo é acabar gerando uma bela de uma decepção.