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Resenha (sem spoilers): Mulher-Maravilha — a Grande Guerreira descobre que guerra não faz ninguém grande

Por favor, assista à Mulher-Maravilha no cinema. Depois, confira nossa resenha do novo filme da DC, sem spoilers (só os dos trailers).

7 anos atrás

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Alguns dias atrás um portal publicou uma resenha muito criticada por dizer que Mulher-Maravilha é tão bom que parece filme da Marvel. Lamento informar mas estavam certos. Em muitos momentos parecia estar assistindo Capitão América, não um filme de Zack Snyder, mas ao mesmo tempo as qualidades boas dele estavam lá, devidamente domado pelas hábeis mãos da diretora Patty Jenkins.

Vamos então a uma resenha sem spoilers (trailers não contam):

A Mulher-Maravilha foi criada em 1942 por um tarado chamado William Moulton Marston, e deveria ser o anti-Super-Homem, usando sua feminilidade como contraponto à violência. Rapidamente ela virou uma heroína normal e conseguiu seu espaço, sendo uma mulher de seu tempo mas sem nunca deixar de questionar injustiças.

De lá pra cá a Mulher-Maravilha foi crescendo nos quadrinhos, e com a série estrelada por Lynda Carter entrou para o imaginário popular, mas quem não lê gibis não tem noção da importância da personagem, que se tornou parte da Santíssima Trindade da DC Comics:

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Dos três ela era a única a não ter uma aventura solo no cinema, mas sendo realista não era fácil para ninguém. Entre o Batman do Adam West e o do Tim Burton foram 23 anos de diferença. Antes do Adam West Batman era um seriado de cinema, em 1949. A Mulher Maravilha teve um seriado de sucesso e várias tentativas de novas séries e filmes, mas esbarravam no problema básico: ninguém assistia filme de super-herói.

Isso de hoje a gente sair na rua e esbarrar em um cruzado embuçado é novidade. Vivemos a Era de Ouro dos super-heróis no cinema e na TV. O Super-Homem, o maior de todos e mais icônico dos heróis abandonou as telas em 1984 com o horrendo Superman IV, e só voltou com o Superman Returns, de 2002 2006. Foram 22 anos de ausência, Pro. Super. Homem.

Esse filme da Mulher Maravilha não chegou tarde, chegou na hora certa e é o filme que a gente merece e o filme que a gente precisava. E por a gente eu digo a DC/Warner, que não acertava a mão assim tem muito tempo.

É um filme de origem?

Sim, é um filme de origem, a Diana começa como uma pequena menina, fascinada pelos grandes feitos das guerreiras amazonas vivendo em sua ilha pacífica isolada do mundo. Ela quer aprender a combater, para cumprir o papel das amazonas de enfrentar Ares, o Deus da Guerra no dia em que ele voltar, mas sua mãe a Rainha Hipólita não deixa.

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Diana acaba treinando escondida por um tempo, até que salva um espião americano, Steve Trevor. Ele está sendo perseguido por nazis… — digo, Alemães (guerra errada), mas o público não vai diferenciar — e as Amazonas descobrem que as armas modernas são bem mais terríveis do que flechas e lanças.

Para tristeza do Tumblr as Amazonas não são a Utopia Misândrica de antigamente, não tem isso de matar o pobre Steve apenas por botar o pé na ilha. Elas desconfiam não de homens, mas do Homem.

Aqui mais uma vez o filme acertou. As cenas de choque cultural são ótimas, Diana e Steve são literalmente de mundos diferentes, os dois são peixes fora d'água um com o outro, mas nem Diana paga de superior (conscientemente) nem ele é marrento. Também evitaram o clichê alienígena bobinha perguntando o que é sexo.

Diana é inocente, não é ingênua. Palmas por não caírem no clichê.

Sua inocência, como toda inocência é a primeira vítima da Guerra. Ao ver soldados mutilados voltando do Front ela começa a perceber que todas as lendas e histórias de gloriosas batalhas têm seu preço. Como todo verdadeiro herói, a Mulher Maravilha aprende que deve lutar porque é preciso, não porque gosta.

Ela acaba negociando com Steve, ela o leva até Londres, onde ele poderá avisar sobre as terríveis armas químicas alemãs que descobriu, e ele a levará até o front, onde Ares com certeza estará, fomentando a guerra.

Então ela é iniciante?

Não. Em filmes de super-heróis no primeiro em geral o herói começa incompetente e vai aprendendo, mas ela é Diana de Temiscera, filha de Zeus e da Rainha Hipólita, Princesa das Amazonas então ela sai da Ilha Paraíso com seu treinamento no 10. A questão é que durante o filme ela aprende que é mais forte do que acha que é, salta mais longe do que acha que salta e no final seus poderes, bem…

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Foi uma mudança muito bem-vinda no modelo de filme de origem e tornaria quase todos muito mais palatáveis.

Primeira Guerra, DC, então é deprê.

Incrivelmente não. Esse deveria ser o filme mais cinza da DC, a Primeira Guerra Mundial É totalmente cinza, triste, nenhuma foi mais violenta e desumana, prato cheio pros darker knights, mas não. O filme é leve sem ser debochado, tem bom humor, legítimo, não o humor negro do Alfred nos filmes do Batman. O terceiro ato é mais sério, mas os dois primeiros são para lavar a alma daquele clima de chuva soturna do Batman vs Superman.

A Mitologia Mudou Muito?

Sim, super-heróis são arquétipos que se adaptam, o Homem de Ferro original tinha sido feito prisioneiro pelos Vietcongs, Super-Homem vem caindo na Terra cada vez mais tarde, a cada encarnação. Desta vez resolveram andar pra trás e em vez de ambientada na 2ª Guerra Mundial a Mulher Maravilha apareceu anos antes. O Panteão de Deuses parece ter se acabado também, aparentemente Ares é o último deles. Até para ganhar tempo a subtrama da competição entre amazonas para achar a emissária foi removida.

Também não usaram a explicação de que a emissária de Temíscera usava as cores do país visitado, como forma de homenagem. Esse foi um retcon famoso para explicar o traje patriótico da Maravilhosa, mas na versão de Gal Gadot ela não está mais enrolada em uma bandeira.

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Ela é uma heroína feminista?

A Emma Watson diria que sim e eu concordo com tudo que a Mione disser. Só que isso significa que ela não faz o discurso Morte Aos Homens, Diana tem mais com que se preocupar. Mesmo quando os políticos na Câmara dos Lordes têm um ataque de pelanca ao ver uma mulheeeerrrr no recinto Diana está incomodada, não ofendida. Ela sabe que pode exterminar cada um ali com um peteleco, não tem porque pagar de ofendida indignada. São insetos. Uma formiga te incomoda, não te ofende.

Ao mesmo tempo ela aprende a reconhecer a lealdade e a camaradagem entre os Howling Commandos homens que Steve Trevor recrutou para sua missão suicida. Em um filme tão colorido a Mulher Maravilha percebe que o mundo é cinza, e que você pode ser uma pessoa boa, independente do que seu povo faça. O diálogo com o Chefe Apache (não aquele) é especialmente forte, apesar de rápido.

Diana é uma personagem focada em sua missão, matar Ares, mas tem tempo de ser mulher, de ser ela mesma. Para delírio dos fãs de quadrinhos até a cena do sorvete aparece. Ela foge de todos os principais clichês, é uma rara personagem feminina forte, entre homens que não é “um dos rapazes”.

Ela é tudo que muitas feministas sempre quiseram e reclamaram da raridade, uma personagem genuinamente feminina que não está atrelada ou é definida por homens, e mais ainda: ela não é uma Mary Sue, não é descomplicada e perfeitinha. Diana não conhece nosso mundo não conhece seus poderes e combate lado a lado com o grupo de Trevor. Ela, assim como Thor em Stargate, é uma deusa que não quer que seus seguidores se ajoelhem, mas fiquem a seu lado, como iguais.

Então os fãs tradicionais vão odiar?

NÃO! A genialidade da Patty Jenkins foi enfiar a cara no material original, e perceber que se você tirar a panfletagem, o discurso misândrico, o radicalismo e outras bobagens que a geração textão resolveu achar que é feminismo, a Mulher Maravilha é TUDO que uma mulher moderna e descolada quer em uma heroína.

Ela não mudou NADA da personagem, o leitor mais tradicional vai encontrar nessa versão a SUA Mulher Maravilha, ela não foi domada adaptada distorcida e politizada. É a NOSSA Diana, o grande feito da Jenkins e do roteiro de Zack Snyder e Allan Heinberg é mostrar essa Diana ao mundo. De uma certa forma é um tapa na cara, já que quem manteve essa personagem viva foram os nerds espinhentos e desprezados pelas meninas que agora descobriram a personagem. Azar delas poderiam estar lendo há muito tempo.

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Sim, há amazonas negras em Temiscera. Ah mas amazonas são gregas. Bem, explique isso pra Núbia, que apareceu em 1973 e reivindicou o título de Mulher Maravilha. De resto, consulte um mapa. Grécia não fica exatamente na Dinamarca.

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Vamos ao que interessa, ela chuta bundas?

A danada tem uma espada chamada Godkiller, o que você acha? Ela bate, e bate gostoso, ainda mais depois de ver do que os alemães são capazes. Mais ainda: pela primeira vez o laço é bastante usado como arma ofensiva, o que resolveu o problema de enfrentar armas de projéteis com uma espada e um escudo.

Mesmo assim ela está se contendo, da mesma forma que Clark na luta final com Darkseid, ela vive em um mundo de papelão, sempre cuidado para não quebrar nada ou machucar alguém. Machucar MUITO, claro.


Warner Bros. Pictures — WONDER WOMAN – Rise of the Warrior [Official Final Trailer]

Uma das lições do filme é que é danado de conveniente culpar um único homem por tudo de ruim que acontece no mundo, quando na verdade todo mundo é responsável e todo mundo tem potencial para o bem ou para o mal. Diana percebe isso, e mostra a Ares de onde vem a verdadeira força.

Homenagens e Referências

Tem bastante, inclusive uma cena inteira que é quase remake da mesma cena no Superman do Christopher Reeve. Vilões como a Dra Veneno vieram direto dos quadrinhos. Curiosamente no original ela só revelou ser mulher depois de um bom tempo, os leitores eram conservadores demais para aceitar uma supervilã tão eficiente. Etta Candy, a melhor amiga da Mulher Maravilha também aparece. Sameer é um dos Blackhawks e Fausta Grables, da série de TV da Mulher Maravilha aparece em uma cena, além dos óculos da Diana Prince também da TV. Onde já se viu proteger identidade secreta com óculos, pfff.

Conclusão

Mulher Maravilha conseguiu finalmente explicar pra que que servia o poder do Coração daquele índio inútil do Capitão Planeta. O filme tem dois momentos de reversão de expectativa. O primeiro você vê a quilômetros de distância, o segundo só quando está bem mais próximo. A história é bem linear e não vai ganhar nenhum Oscar de roteiro, mas estão bem-feito e amarrado.

Diana não veio para tomar lugar de ninguém, veio para acrescentar e é muito, muito bem-vinda. Eu diria que ela tem o mérito de CRIAR o Universo de Filmes realmente bons da DC, o que era se se esperar, criar universos está bem dentro da descrição do trabalho de uma deusa.

Cotação

5/5 Lyndas Carters

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UPDATE:

Não tem cena pós-créditos.

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