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NASA prepara caminhada espacial de emergência para consertar computador quebrado

Assim como Houston agora você está sabendo: a ISS teve um problema. Um computador essencial para a sobrevivência dos astronautas deu defeito. Por sort… — digo, por puro planejamento há uma unidade de backup que assumiu as funções, agora vão fazer uma caminhada espacial para trocar a defeituosa. Rotina? Felizmente não.

7 anos atrás

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Como a inteligência somada dos computadores da Estação Espacial Internacional não ultrapassa dois ou três comentaristas de portal, a comandante Peggy Whitson não vai sair amanhã em sua 11ª caminhada espacial muito desconfiada, embora as evidências ainda apontem para um motim cibernético.

Neste momento a Estação Espacial corre risco teórico de perder energia e sistemas de refrigeração. Um módulo importante do computador que controla esses sistemas falhou. Pior, ele tinha acabado de ser substituído, na caminhada do dia 30 de março. 

Primeiro, o que deu errado?

Foi isto aqui que queimou, um MDM (multiplexer-demultiplexer).

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O barramento de dados da porção americana da ISS funciona em três camadas. A principal, que controla todo o complexo, a intermediária, que controla sistemas específicos (navegação, energia, etc) e as locais, que podem ser capilarizadas até experimentos específicos.

Todo esse fluxo de dados é gerenciado por MDMs que recebem os sinais de vários barramentos, os combinam organizam e disponibilizam para o barramento superior. Eles também recebem dados e os enviam para sistemas individuais, assim você não precisa ter um cabo direto entre o computador principal e um sensor de fótons na unidade AE-35.

Da mesma forma que o parafuso sempre cai no buraco mais inacessível do gabinete, e a lâmpada que queima é a do soquete mais alto, o MDM que queimou foi o externo. CLARO, tinha que ser, um dos vários internos seria trivial trocar, mas Murphy não perdoa.

A situação não é crítica, claro, tanto que estão planejando com calma a substituição. Ontem a Peggy montou e testou a unidade de reserva, e todos os sistemas continuam funcionando, pois a ISS é pensada o tempo todo em volta da palavra REDUNDÂNCIA.

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São dois MDMs, quando o primeiro abriu o bico, o segundo assumiu as funções. Sem drama, desculpe Sandra Bullock, mas não deixa de ser sério. Se essa unidade falhar entre hoje e amanhã é capaz da Peggy prender a respiração e sair só de camiseta pra instalar a nova.

Ficar sem energia não é o maior problema, os sistemas de suporte de vida podem ser operados manualmente, e (espero) a NASA já aprendeu a não misturar filtros quadrados e redondos. O maior risco dos astronautas é morrer por excesso de… calor.

Costumamos dizer que o espaço é muito frio, mas isso é um erro. O NADA não pode ter temperatura. E se o espaço é tão frio como a Terra não está congelada? Explique essa, Al Gore. A grande diferença do espaço para um objeto na Terra é que calor, que nada mais é que transferência de energia, aqui acontece de três formas:

1 - Condução — quando você entra no ônibus, senta e o assento está quentinho, está em contato direto com a fonte de calor. Ops, tinha um sujeito no banco. Levante-se e peça desculpas. Ou não, sei lá. A gente aqui não julga.

2 - Convecção — é quando você pensa em pedir desculpas mas fica com vergonha e prefere ficar sentado, vai que o sujeito não percebeu, aí ele fala na sua orelha “fique à vontade, a casa é sua”. O bafo quente é transmissão de calor por convecção.

3 - Irradiação — é quando você acorda na masmorra subterrânea do sujeito do ônibus, ele está com um Gimp Suit completo, seus braços e pernas presos por correias de couro. Ele acende um cigarro, aproxima a brasa de seu rosto e você sente o calor. Ao mesmo tempo percebe que não lembra mais da Safe Word…

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No espaço dois corpos separados não podem transferir calor entre si por nenhum método que não seja irradiação. Sim, vácuo é um excelente isolante térmico, pergunte pra um cientista ganhador do Nobel ou para sua garrafa térmica.

O resultado é que a única (ok principal) fonte de calor da Estação Espacial é o Sol. A radiação térmica (também conhecida como luz em todas as frequências do espectro) aquele algo diretamente exposto a ele até uns 121 ºC. Se você tampar essa área ela começará a emitir fótons, e se resfriará até – 170 ºC, quando atingirá equilíbrio, sendo aquecida pela radiação térmica da Terra, da ISS, dos astronautas e até a radiação de microondas de fundo do Universo.

Para evitar ser churrasqueada, a ISS é coberta de material refletor e isolante térmico. Naves menores complementam isso com uma manobra frango de padaria, onde giram em torno de seu eixo, expondo todas as partes ao Sol.

No caso da ISS além da camada isolante eles usam radiadores térmicos:

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Sim, uma das placas refletoras descolou. Acontece. A foto é antiga.

Esses equipamentos circulam amônia por tubulações, removendo o excesso de calor da estação e jogando no espaço. É basicamente a mesma coisa que a sua geladeira, com o detalhe que a eficiência é muito pior: não há perda por convecção. Note também que eles ficam perpendiculares aos painéis solares, assim absorvem o mínimo de radiação solar. Por isso a serpentina da sua geladeira fica atrás, e não no teto.

Eles vão aproveitar a saída de amanhã para instalar também umas antenas e trocar os cubesats do lançador japonês. Não sei quantos MDMs de backup eles ainda tem no estoque, mas como dia primeiro sobe uma Dragon levando suprimentos, é capaz de encaixarem um ou dois, só pra ficarem seguros.

Esse é o dia-a-dia da ISS, mas não é realmente perigoso. Em último caso eles entram nas Soyuz e voltam pra Terra. Uma nave a caminho de Marte não teria essa possibilidade. Por isso a cena em 2001 faz tanto sentido:

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No espaço não tem como chamar um técnico. Astronautas precisam saber como tudo funciona, como diagnosticar problemas e como consertar. Ou seja: quer que seu filho seja astronauta? Compre um Arduíno pra ele.

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