Ronaldo Gogoni 7 anos atrás
Recentemente discutimos aqui sobre a briga da Elsevier com o Sci-Hub, o repositório público que agrega e disponibiliza artigos científicos normalmente protegidos por paywall para quem quiser ler, sem a necessidade de carteirada ou de abrir a carteira.
A questão principal é "a quem pertence o conhecimento"? Ao pesquisador, à população, ou ao periódico que cobra pelo acesso?
Como funciona hoje? O pesquisador se mata de trabalhar e estudar para produzir sua pesquisa, e trabalho realizado, é preciso publicá-lo. Entram aí os periódicos de grande nome como a Nature e a Science Magazine, que se não cobram diretamente do pesquisador submetem o artigo a critérios de avaliação malucos, que consideram inclusive o valor de buzz que a pesquisa poderá gerar, o que intensifica a procura, gera mais visualizações e consequentemente, mais dinheiro para o periódico.
Caso seja aprovado, o trabalho do cientista é indexado e publicado, só que fica protegido atrás de um paywall que cobra pelo acesso (algo que também não é muito simplificado para leigos em alguns casos). A Elsevier, o maior repositório do mundo, é ainda mais inescrupulosa, pois cobra quantias do pesquisador que podem chegar a até US$ 1.000,00 para este ter seu trabalho indexado. Ou seja, ela lucra duas vezes.
Ah, sim, desnecessário dizer que os periódicos não retornam um tostão ao pesquisador.
Aí você pergunta: por que o pesquisador se sujeita a isso? Devido ao Fator de Impacto: publicar numa Nature ou numa Science causa muito mais impacto na comunidade científica que na PLOS One, que embora libere o acesso também já publicou muito lixo, já que funciona no esquema “pagou, publicou”.
Assim temos o bizarro cenário em que o conhecimento é eletivo, só ao alcance de quem pode pagar. Alternativas como o Sci-Hub, que tentam democratizar o acesso, são muito bem-vindas, mas este é um território nebuloso, já que estamos falando de uma prática ilegal.
E é por causa disso tudo que a União Europeia resolveu por um basta nessa farra. No último dia 27. o Conselho de Competitividade da UE determinou que todos os artigos acadêmicos, produzidos por instituições públicas do bloco econômico, deverão ser disponibilizados em caráter de acesso aberto, até o ano de 2020.
A decisão ainda não tem força de lei, mas isso é questão de tempo, 28 países assinaram a resolução (cuidado, PDF) e não tem volta, é aceitar de cabeça baixa ou sofrer as consequências.
Obviamente que os defensores do formato de paywall não estão nada contentes, e para a surpresa de ninguém a Elsevier está liderando o bloco dos reclamões, seguido de perto pelo conglomerado Springer-Nature (responsável pela Nature, obviamente). Ambos defendem o formato de seus negócios, mas sinceramente, terão de aceitar resignados que vão perder rios de dinheiro na Europa.
Claro que é um pequeno passo para vermos o cenário ideal de conhecimento livre em todo o globo, mas é um começo. Eu defendo que o conhecimento científico deve, sim, ser colocado ao alcance de todos e não concordo com a cobrança dos periódicos, que gozam de renome para comercializar bens de coisa pública, que não pertencem a ninguém.
Com informações: Science.
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