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Godspeed, Discovery!

13 anos atrás

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Muito, muito tempo atrás saí do cinema em êxtase. Devia ter sete ou oito anos e havia visto um filme totalmente alienígena para uma criança pré-Star Wars: 2001, Uma Odisséia no Espaço. Meu sentimento era claro: Não tinha a menor idéia do que havia assistido, mas havia adorado a experiência.

Tempos depois vejo o motivo do filme ter ressoado tanto. Ele é primal. O homem-primata selvagem pré-capitalista descobrindo (com uma ajudinha do Monolito) o uso de ferramentas foi lindo, um momento essencial na História de nossa espécie. A passagem de tempo com o osso lançado para o alto  cortando para o satélite foi a mais longa e ousada já feita no cinema. HAL era e ainda é O modelo segundo o qual todos os computadores inteligentes, reais ou não são comparados.

As cenas sem som no espaço, uma simples toque de realismo foram tão marcantes que quando no Star Trek de JJ Abrams um tripulante é cuspido para o espaço durante o ataque romulano e subitamente faz-se silêncio, não só pela primeira vez na história de Jornada nas Estrelas a gente se importa com a morte de um personagem secundário como a referência mental foi 2001. Na hora.

A Discovery de Kubrick/Clarke foi talvez a primeira nave funcional já mostrada no cinema. Tudo tinha um propósito, nada era meramente estético. Não tinha lasers fazendo pew pew pew nem gravidade artificial. Quer dizer, até tinha, de verdade. A centrífuga, que David Bowman aparecia correndo e mais tarde foi emulada no Skylab da NASA (menos a parte giratória) foi construída por Stanley Kubrick, ele não teve paciência de esperar a invenção dos computadores necessários para fazer tudo em CGI.

Quando a NASA lançou seu programa de naves reutilizáveis meu lado trekker ficou feliz com a escolha de Enterprise como o nome da primeira nave de testes, mas foi meio triste perceber que ela nunca chegaria ao espaço. Embora planejado adaptá-la para vôo orbital acabou ficando caro demais. Por isso foi o máximo o anúncio do lançamento da Discovery, nada mais justo do que homenagear Arthur Clarke, o maior divulgador da exploração espacial.

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Os Shuttles foram uma revolução. Até então o astronauta basicamente subia no alto de uma bomba do tamanho de um prédio e rezava durante todo o trajeto, até a reentrada, quando caía como uma pedra. Com os Shuttles e sua estrutura aerodinâmica os astronautas passaram a ficar ao lado de uma bomba do tamanho de um prédio, rezar durante todo o trajeto e na reentrada, como era feita em planeio, imitar Buzz Lightyear e cair com estilo.

Parece pouco mas na mente de uma criança era uma nave espacial que parecia uma nave espacial, finalmente estávamos evoluindo da venerável Apollo. Para a NASA a economia também foi absurda, infelizmente o fiz da corrida espacial acabou prendendo a agência ao modelo. O Shuttle original voou pela primeira vez em 1981. mas o projeto foi iniciado em 1969 pelo Presidente Nixon. Por mais que tenha sofrido modernizações ainda é o auge da tecnologia do começo da década de 1970, e isso hoje é caro e inseguro demais.

Até hoje foram 132 vôos. Com as tragédias da Challenger e da Columbia, é 1 chance em 66 de você morrer ao colocar o pé naquele caixão voador. Dá uma mortalidade de 1,51%. Com a média de 49,8 milhões de passageiros em 2009, se a indústria aeronáutica nos EUA tivesse a mesma mortalidade morreriam 204.657 pessoas POR DIA em acidentes de avião, só na terra do Tio Sam.

Mesmo assim eu iria sem pensar duas vezes.

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Depois de somar o equivalente a um ano no espaço, invejável 1/5 da fictícia missão da Enterprise, a Discovery vai ser descomissionada. A Frota (e para um geek é muito excitante poder falar Frota nesse sentido) já ultrapassou em muito todas as possibilidades técnicas e financeiras. Amanhã, dia 24/2/2011 a Discovery –se tudo der certo, o velho lema da exploração espacial- decolará para a missão STS-133.

Depois dela teremos a Edeavour, com a STS-134 e a Atlantis, que com a missão STS-135 encerrará o programa.

A Discovery será a primeira nave do programa a se aposentar. Muito provavelmente ocupará um lugar de honra no Instituto Smithsoniano, inspirando uma nova geração de pioneiros, que poderão ver e tocar uma veículo sonhado e criado pelo Homem que levou gente audaciosa até às fronteiras do desconhecido, mantendo viva nossa necessidade genética de exploração.

Por um lado é triste lembrar da Columbia, nave que vi em seu vôo inaugural e que vi em seu vôo de morte, mas ela serviu como aviso de que não há rotina no espaço. Não há nada simples e seguro na vida de quem se propõe a expandir os limites do conhecimento, e se chamam o Espaço de Fronteira Final, há um bom motivo. Foi triste mas foi bonito, uma gloriosa pira funerária rasgando o céu por vários Estados. Há jeitos bem mais medíocres de morrer.

Não que os astronautas da Discovery estejam pensando nisso. No momento devem estar revisando os últimos procedimentos antes de se preparar para embarcar. A NASA, que não é boba nem nada colocou a missão sob o comando de Steven Lindsey, que não é James Kirk mas tem 1203 horas de vôo no espaço e 6500 horas pilotando mais de 50 tipos de aviões, entre A-10, F100 e Phantons.

A Missão durará 11 dias. Há 80% de chance, diz o pessoal do clima, da decolagem ocorrer às 16h30min, hora do Leste. O melhor local para achar a hora certa do lançamento é, claro, na página da NASA. Para assistir é só acessar a NASA TV, do seu navegador ou das Apps disponíveis para os melhores smartphones e tablets.

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