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Das dificuldades técnicas de jogar Donald Trump no Sol

Uma petição esta querendo que a NASA lance Donald Trump no Sol. É uma péssima idéia, e não só por poluir nossa única estrela, mas as Leis da Física também não colaboram. Não é tão fácil quanto parece jogar algo no Sol.

7 anos atrás

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Está rolando uma petição bem interessante, que pretende resolver a sinuca-de-bico que os EUA se meteram: a idéia é angariar assinaturas para que a NASA lance Donald Trump no Sol.

Eu sei que é algo inédito, nunca antes acontecido na história das Petições Online, mas não vai dar certo. Não que a idéia não seja boa, mas há impedimentos de ordem prática. Além do Serviço Secreto não ficar muito feliz com a idéia de defenestramento orbital de um presidente eleito, as próprias Leis da Física não colaboram.

A verdade é que é mais fácil lançar uma sonda no espaço interestelar do que jogar algo no Sol. Parece contra-intuitivo, e é. Nossas percepções, moldadas em um período de 4,2 bilhões de anos (ou 6 mil se você mora no Texas) levam em conta nossas experiências em uma superfície planetária, a idéia de que não basta apontar para um lugar e andar em direção a ele não faz sentido para nós.

Esse é o grande problema de colocar Trump em um foguete e lançar no Sol, idéia aliás levantada de vez em quando como solução para outros tipos de lixo, como o nuclear.

Lembre-se: uma órbita não é uma trajetória em círculo. Não existe isso na natureza. O que temos é uma infinita série de movimentos perpendiculares, vetores são retas. O resultado pode parecer uma curva, as forças não.

Órbitas também não são trajetórias sem gravidade. Pelo contrário, uma órbita depende da gravidade. Um objeto orbital nada mais é que alguma coisa com uma velocidade horizontal muito alta, tão alta que se move lateralmente muito mais rápido que verticalmente, então quando chega ao chão, a curvatura da Terra já tirou o chão dali.

Como Douglas Adams (acho) falou, Órbita nada mais é que mirar o chão e errar todas as vezes.

newton_s_cannon_medium

Veja neste diagrama os vetores de aceleração gravitacional e velocidade tangencial de um objeto em órbita:

orbital_motion

Para chegar no planeta você tem que perder velocidade horizontal, e não ganhar aceleração vertical. Aquelas cenas de filme da nave indo em direção ao planeta com o motor ligado são completamente erradas, por um princípio bem simples: a resultante de dois vetores perpendiculares.

planet

Se você adicionar força ao vetor g e usar o bom e velho Pitágoras, perceberá que a resultante aumenta. Ou seja: o objeto cairá mais rápido em direção ao planeta, mas na diagonal. Isso faz com que ele erre o planeta mais rápido.

Em termos orbitais você adicionou energia ao sistema, o apogeu aumentou, pois a força que puxa a nave para o planeta tem sempre que ser idêntica à força tangencial que tenta manter a nave voando em linha reta para longe do planeta.

Vejamos um exemplo no Kerbal:

Eu construí esta naveta aqui, com uma cúpula de observação e meio tanque de combustível:

kerbal1

Ela está precisamente posicionada a 5.000 km acima de Kerbol Kerbin:

kerbal2

Ela está apontada para o planeta. Sua velocidade orbital é de 794,1 metros por segundo. Nem mais, nem menos. TUDO em uma órbita circular nessa altitude tem essa velocidade. Se Você acelerar, a órbita aumenta, se desacelerar, ela diminui.

kerbal3

Só que se você desacelerar, a sua altitude NAQUELE PONTO não diminuirá. Viu como não é intuitivo? Você está removendo energia do sistema, mas a força te puxando para baixo é a mesma.

Vamos voltar ao exemplo: estamos apontando para Kerbol Kerbin, vamos acionar o motor, queimar meio tanque de combustível. Estamos voando em direção ao planeta, devemos ter chegado bem mais perto, certo?

De 5.000 km passamos para 4.998 km quando os motores desligaram. Só que nossa órbita agora é assim:

kerbal4

Sua velocidade orbital agora é de 978 metros por segundo. Naquele ponto do espaço isso significa que você está caindo em direção a Kerbol Kerbin e vai errar por 2.800 km, em vez de 5.000. Chegando tão perto vai ganhar mais velocidade, chegando a 1.800 metros por segundo.

E se você está a 2.800 km de altitude viajando a 1.800 metros por segundo, isso te colocará em uma trajetória que atingirá uma altitude máxima de 19.300 km, quando começará a cair de volta para Kerbol Kerbin.

Como descer então? Simples, você aponta a nave para a direção oposta da órbita. Vai reduzir o vetor de velocidade orbital, isso reduzirá o perigeu. Esta é a posição:

kerbol5

A velocidade orbital foi reduzida de 794,1 m/s para 200 m/s. Só que a altitude não corresponde. 200 m/s segundo é lento demais para cair em direção ao planeta e errar. Veja como fica a trajetória, que não é mais uma órbita estável:

kerbal6

A parte ruim é que a nave atingirá a atmosfera a 3 km/s o que é… ruim.

E onde entra o Trump nisso?

Colocar algo em órbita é fácil, basta conseguir um delta-V de 8 km/s. Mais 3 km/s e temos velocidade de escape, dá pra ir pra Lua, Marte, etc. Já para chegar no Sol você tem que desacelerar, como fizemos no exemplo acima. Só que — não se esqueça — uma nave em órbita da Terra está se movendo junto com ela a 29,8 km/s.

A única forma de cair no Sol é a nave anular essa velocidade. E isso não é fácil. A Juno precisou pegar um empurrão gravitacional da Terra para chegar a 40 km/s e viajar para Júpiter em um tempo razoável. Isso é quase velocidade de escape do Sistema Solar, partindo da Terra.

Agora o ponto interessante: um objeto que parta da Terra a 42,1 km/s vai deixar o Sistema Solar. Está rápido demais para a gravidade do Sol conseguir segurá-lo. Então, como as Voyagers e a Pioneer conseguiram?

Simples: nós estamos nos movendo a 29,8 km/s. Isso significa que para atingir velocidade de escape um objeto só precisa de mais 12,3 km/s de velocidade, e de qualquer jeito 8 km/s ele já tem por estar em órbita baixa. Qualquer coisa na órbita baixa da Terra que ganhe mais 3,3 km/s de velocidade deixa o Sistema Solar.

Já o foguete levando o Trump não seria tão simples. Teria que fazer várias manobras para drenar velocidade, como a Messenger, que foi lançada para Mercúrio em 2004 mas só entrou em órbita em 2011.

Ela foi lançada, fez uma passagem pela Terra no ano seguinte, depois DUAS por Vênus e três por Mercúrio antes de entrar em órbita.

britoca — Messenger Probe Launch to Orbit Trajectory

O mais complicado é que ao mesmo tempo em que você precisa reduzir a velocidade orbital para cair para o Sol, perto dele as coisas se movem mais rápido. A Messenger pisou no freio, começou a cair até atingir uma velocidade orbital de 47,4 km/s, que é a de Mercúrio.

A maior ironia é que se tivéssemos mandado Trump com a Messenger seria pior ainda. Se você entendeu tudo que eu expliquei, já sacou: com uma velocidade orbital de 47,4 km/s é muito mais difícil lançar algo no Sol partindo de Mercúrio do que partindo da Terra.

E nem adianta sugerirem lançar Trump em um Buraco Negro. Ao contrário do que os filmes mostram, é um INFERNO você conseguir que algo caia, a maior parte da matéria acelera em uma parábola e é ejetada de volta pro espaço.

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