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Apple tira de linha iPod, o MP3 Player que ninguém queria

O iPod já foi sinônimo de player de MP3, dominando o mercado e revolucionando a indústria de música online. Agora ele chegou ao fim da linha.

2 anos atrás

Pois é, assim como Zed, iPod is dead, baby. 10 de maio de 2022 a Apple descontinuou a produção do iPod Touch, o último representante da venerável e icônica linha de dispositivos, iniciada em outubro de 2001.

iPod Video, fiel companheiro de longas jornadas. (Crédito: Carlos Cardoso / MeioBit)

O que matou o iPod foi a própria Apple, ele se tornou uma aplicação rodando no iPhone, um player dedicado para música é algo totalmente redundante, não faz mais sentido carregar dois aparelhos. Assim como as câmeras digitais amadoras, players dedicados de música foram varridos da face da Terra, ambos só sobrevivem em nichos bem específicos.

O primeiro iPod, chamado hoje de Classic, vinha com um HD de 5 GB, de 1,8 polegadas (4,57 cm) da Toshiba, bem menor que o HD de 2,5 polegadas (6,35 cm) usado por outros dispositivos. Com capacidade para 1000 músicas, ele só era compatível com Macs. Teoricamente ele seria só mais um tocador de MP3, então como a Apple revolucionou a indústria?

Outros players do mercado tinham players em suas linhas de produtos, incluindo o Creative Nomad Jukebox, lançado em 2000, com um HD de 6 GB. Em comum todos esses players compartilhavam interfaces horríveis ou inexistentes, baterias pífias e em geral eram mais feios que encoxar a mãe no tanque.

Creative Nomad Jukebox. Sim, era um trambolho. (Crédito: Reprodução Internet)

Usar um player MP3 pré-ipod significava converter você mesmo seus CDs ou LPs (ou baixar pingado via linha discada, música a música), e organizar manualmente sua biblioteca. O que o iPod trouxe não foi um player, mas um ecossistema completo.

Hoje todo mundo odeia o iTunes, mas ele trouxe uma solução completa, agregando uma loja de música e um sincronizador para o iPod. E ele era bem amigável se você jogasse seus MP3 para dentro, mas o importante mesmo foi tirar o MP3 player do gueto nerd.

A Apple vendeu o iPod como um produto descolado para gente descolada, ele não era coisa de nerd como um Diamond Rio. A empresa teve até dificuldade com um segmento nerd bem específico: Seus próprios usuários.

Diamond Rio. (Crédito: Reprodução Internet)

Henry Ford dizia que se fosse ouvir o público consumidor, eles iriam querer cavalos mais rápidos. Muitas vezes o consumidor não sabe o que quer, e grupos como fanboys da Apple costumam ser bem fechados para inovações.

Quando surgiu o boato de que a Apple estaria lançando um produto novo, os fãs imaginaram todo tipo de traquitana. Anunciado o iPod, a resposta foi a pior possível, como demonstrado por esta thread de 2001 no MacRumors:

Alguns exemplos dos comentários:

“iPoop… iCry. Eu esperava por algo a mais.”

“Grande, justo o que o mundo precisa, outro maldito player de MP3. Vai Steve, cadê o Newton?”

“Hey, algumas idéias, Apple: Ao invés de entrar no mundo dos brinquedos e gadgets, que tal gastar um pouco de tempo resolvendo sua pateticamente cara linha de servidores? Ou vocês realmente querem se tornar uma glorificada empresa de gadgets de consumo?”

“US$400 por um MP3 Player!”

“Eu chamaria de Cube 2.0 e não vai vender, será morto em pouco tempo, e não é realmente funcional”

“Todo esse hype em torno de um MP3 Player? Dispositivo Digital Revolucionário? O campo de distorção da realidade está distorcendo a mente do Steve se ele pensa por um segundo que essa coisa vai decolar”

“Esse iPod é para garotos ricos mimados com pais insanos ou fãs da Apple fanáticos como Talibãs. Ele tem boas características mas esqueça comprar um por US$399!!! Nunca, quem comprar essa coisa é uma pessoa muito estúpida!”

“Steve Jobs está sob efeito de uma consultoria terrível ou muita maconha. A proposta não é realista. Se a Apple fizer algo assim de novo, vai falir”

“Escolha ruim. O produto está fora da competência da Apple – dispositivos de computação – Quando a maioria pedia por um PDA, eles lançam um Player de MP3”

 

Todos, basicamente todos estavam errados. A Apple deixou de ser vista como uma empresa de computação e caiu no imaginário popular como produtora de pura inovação, mesmo nem sempre sendo.

Depois do Classic, vieram aperfeiçoamentos, com mais capacidade de armazenamento, tela colorida, capacidade de reprodução de vídeo. O iPod vídeo foi meu companheiro em muitas viagens, 6,5 horas de reprodução eram mais que suficientes, e impressionantes para um dispositivo de 2006.

MeioBit, em 2007 no meu antigo iPod Touch (Crédito: Carlos Cardoso /MeioBit)

Enquanto a concorrência tentava enfiar mais recursos e mais botões em seus players, a Apple continuou com a filosofia “apenas funciona”, com interfaces minimalistas mas excelentes. Nada até hoje supera a click wheel do iPod, para lidar com menus verticais.

Eventualmente os discos rígidos foram abandonados, e o formato dos iPods ganhou mais liberdade, o que resultou no que é o iPod mais elegante de todos, o Nano.

O iPod acabou se tornando um fenômeno cultural, dominando mais de 90% do mercado de players de MP3, para tristeza dos fanboys. O que ninguém esperava é que ele transcendesse o mercado de música.

iPods eram usados em treinamentos empresariais, audiolivros, museus e exposições usavam iPods como narradores de visitas guiadas, aposentando os surrados walkmen. (sim, eu sou pedante a ponto de pluralizar corretamente Walkman)

o iPod influenciou outra indústria que a Apple não criou mas basicamente popularizou: Em 2004 surgiu o iPodderX, o primeiro software com interface gráfica para baixar programas de áudio da Internet e enviá-los para um dispositivo físico mobile.

Dispositivo físico mobile na época era sinônimo de iPod, e esses programas de áudio ganharam um nome associado: Podcast. Era algo muito novo. Seguindo a Wikipedia, em 28 de setembro de 2004 uma busca no Google por “podcasts” retornava... 24 resultados.

No ano seguinte a Apple adicionaria suporte a podcasts no iTunes, seus usuários podiam escolher entre dezenas, depois centenas e hoje dezenas de milhares de podcasts, com gente falando sobre política, ciência, humor, cultura pop, tecnologia...

Hoje podcasts existem em todos os lugares, todo mundo tem um podcast, e eles vão muito além do iTunes e da Apple, embora seja meio que obrigatório você registrar seu podcast lá, questão de tradição, devemos respeitar.

iPod Nano, o melhor de todos. (Crédito: Carlos Cardoso / MeioBit)

A longa sobrevida do iPod pode ser explicada por, entre outros fatores, o reduzido armazenamento dos celulares de antigamente, suas interfaces horrendas e velocidades rubinhescas. Sim, era possível ouvir MP3 no Nokia E71 ou no N95, em teoria até no Motorola Razor, mas a experiência era equivalente a fazer coleta de sêmen em um beija-flor usando luvas de boxes.

Isso é demonstrado com o auge das vendas do iPod acontecendo no ano de 2008, somente depois da chegada do iPhone, em 2007 smartphones começaram a ter interfaces melhores, e mais recursos de hardware e armazenamento. Mesmo assim foram anos até o iPod se tornar redundante.

Tanto que o iPod de maior longevidade, o iPod Touch, é basicamente um iPhone sem a parte de telefonia. O Touch foi lançado em 2007 e só foi descontinuado em maio de 2022. Quinze anos de existência, para uma linha de produtos em tecnologia, é algo bem raro.

Nos últimos anos a Apple vinha escondendo cada vez mais o iPod Touch de 7ª geração, lançado em 2019 e o último da linha. Agora, tornou oficial. O iPod viverá só em nossas lembranças e gavetas, obrigado por tudo, pequenino.

F (Crédito: MeioBit)

 

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